sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Confissões de Laly Cap.91 - A noite que não queria TERMINAR! - parte 1


A noite que não queria TERMINAR! (IMPERDÍVEL!)

O tombo cinematográfico que levei poderia ser tranquilamente exibido em programas de vídeo cacetadas. Mais: com direito a um merecido replay.


Ai meu braço!Ai que dor!

-MANHÊ!

-Lalinha! - gritaram as meninas

A dor travou todos os mecanismos de descrição. O que sei são as versões de Fer e Mayra.

Nilton estava chegando do trabalho quando me encontrou estirada sob a calçada molhada, chorando e chamando por minha mãe.

-Lalinha.

-Mãeeeee.

Nilton se responsabilizou pelo jantar enquanto May e Fernandoca me levaram ao pronto-socorro.

Abel, parecendo um sagüi de gravata borboleta, desceu da árvore e gargalhou ao me ver rendida. Revanche. Nada mais justo. Estávamos completamente quites.

Imitando uma galinha rebolando, se deliciava com meu braço previsivelmente fraturado.

-Bem-feito, bem –feitooooooo.

Estava tão fora de mim que sequer poderia articular uma boa réplica. Assim era fácil me vencer. E de novo aquela música (Tarzan boy – Baltimora).

Som: Cada um cada um – Claudio Zoli.

Gilberto continua preocupado com a demora de Fernanda e interroga Lílian durante o jantar.

-Tem certeza de que Fernanda não ligou?

-Ah vô, ela já é adulta...

-É adulta, mas não deixa de ser minha filha.

-Ela deve estar bem.

-Mas não disse que ia demorar tanto.

-Ela vai chegar daqui a pouco. Decerto foi ver novela com a May.

-Que visse aqui.

-Você mesmo disse uma vez que mal vê a hora que a Fernanda case porque não quer criar solteirona dentro de casa.

-Quando eu disse isso?

-Sempre que fica brabo.

-Quando você tiver filhos e eles demorarem, vai entender como funciona.

-Não pretendo ter filhos.

-E ainda não deveria pensar nisso. É criança demais.

-Nem gosto de criança mesmo...

-Com a criminalidade crescendo por aí, tenho meus motivos para me preocupar...

-Vô, não acha que está se esquecendo de uma coisa?

-Já sei... Ligar pra Mayra?

-Vô, lembra que quando eu não queria me apresentar porque tinha medo de que caçoassem de mim e você me dizia sempre que quanto mais eu pensasse nisso, mais chances teriam de isso acontecer?Não lembra?Então, vô. Não pense o pior... A Fernanda logo volta...

Gilberto se vê obrigado a concordar com a neta.

Toca Tarzan boy – Baltimora.

-Que sinistro!Esse taxi ta seguindo a gente desde lá de casa. – Mayra frisou

-Quem mais seria? – Fernanda concluiu

-O cara, além de ser um cara de pau, deve ser cheio da grana pra torrar com taxi... Os motoristas daqui metem a faca mesmo...

Deitada no banco traseiro de meu próprio carro, chorava e me retorcia. Sou intolerante a dor, tenho verdadeiro pavor de sangue, machucados e mais ainda de hospital. Quanto menos precisar estar lá, tanto melhor.

-Lalinha?

Nãoooooo!

-Iury?De plantão?

Mayra estendeu a mão para cumprimentar Iury. Era só o que me faltava...

-E Pepo, como vai? – Iury, muito simpático, perguntou

-Travesso que só.

Mayra, afagando minha cabeça na maca, respondeu.

-Já passou de ano e ta curtindo as férias.

-Puxou mesmo o pai.

Fernanda parecia indignada com o fato de Abel estar junto no P.S. como se fosse parente.

-Quebrou um braço, mas está mais forte que um touro.

Abel gesticulava falando ao celular e sempre olhando na minha direção. Mayra, educadamente, fechou a porta.

Fiz um raio-x no braço esquerdo e em seguida Iury o engessou.

Fer e Mayra fizeram questão de contar detalhe por detalhe de meu fatídico dia.

-Pelo menos 30 dias de repouso, leoa.

-A Laly não é do tipo que gosta de repousar. – Fer admitiu

-Tenho de concordar.

Quem diabos deu autorização para o cafajeste entrar? Cínico miserável.

-Namorado? – Iury, confuso, perguntou

-Sou marido dela. – Abel se vangloriou

-Vá sonhando! – resmunguei em voz alta

-Você é casado, Abel. Por que não volta pra sua mulher e deixa a Laly em paz?

Mayra se sentiu na obrigação de expulsá-lo.

-Casado? – Iury pestanejou

E de repente minha vida cabia direitinho no roteiro de uma sitcom fuleira. Os personagens lutavam contra o tempo para apanhar os papeis principais . O enredo era bastante simples e por isso mesmo despertava tanta curiosidade por parte dos espectadores.

Judy morreu, mas a veia artística sobrevivia a extenuante jornada de trabalho e retornava nas férias, transformando dias aparentemente pacatos em pauta perfeita para entreter a velha e nova geração de fofoqueiros da cidade.

-Que é isso no seu braço, Laly?

Gilberto não conseguiu dormir enquanto não nos viu entrar pela porta principal.

-Ela quebrou o braço, vô. – respondeu Lílian

-Disso eu sei, mas como?

-Andando de skate, pai. A Laly, a May e eu resolvemos reviver os velhos tempos e aconteceu um pequeno acidente.

-Pequeno?

Lílian roubava a cena.

-Você chama isso de ‘pequeno acidente’?

-Mas fora isso ta tudo bem, né, Lalinha?Sabe que se precisar de qualquer coisa é só me chamar.

-To bem, seu Gilberto. Obrigada pela preocupação.

-Que susto vocês deram na gente hoje, meninas. Da próxima vez que vocês demorarem, me avisem, pois fico muito preocupado.

-Foi só um imprevisto, pai. Um imprevisto que já está resolvido, não é mesmo, Laly?

-Lhe garanto, seu Gilberto. Lhe garanto que Fer tem toda a razão.

-Então, se é assim, posso ir dormir sabendo que tudo está bem...

Tudo que eu queria era me deitar, dormir e apagar aquele dia da memória, de preferência pra sempre.

-Vou assistir ao programa da Pra. Constantina. Se precisar de alguma coisa, grita. – Fer avisou

Fernanda não consegue dormir antes da meia-noite. Eu, pra falar a verdade, também não, no entanto, naquela noite abriria uma exceção.

-Lalinha, se precisar de alguma coisa, pode dormir lá no quarto, ta?

Lílian apareceu na porta antes de dormir. Que gracinha.

-Pode ir dormir tranqüila, flor. Eu vou ficar bem.

-Tem certeza?

-Absoluta, criança.

Deitei-me e tentei não repassar nenhum fato recente. Caso o fizesse, a descarga de adrenalina me impediria de descansar. Fechei meus olhos e me concentrei nas músicas ambientes da rádio de easy listening que desde a minha infância estava no ar. O repertório, com exceção de uma novidade ou outra, era intocável. Minha mãe adorava as canções e costumava colocar quando eu era bebê para que parasse de chorar. Sempre funcionou.

De repente aquele clarão em frente à janela do quarto. Mesmo com o rádio ligado em um volume bem baixo, podia ouvir os burburinhos da vizinhança.

Movimentação àquela hora da noite só podia significar duas coisas: enchente ou homicídio. Descartando a primeira hipótese por questão lógica, nem tive tempo de raciocinar, pois em seguida o chiado do microfone me confundiu completamente.

-1,2,3... Testando... Testando... 1,2,3... Testando, testando...

Assim começava a noite que não queria terminar...

CONTINUA...

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