61º Capítulo – Sala de espera!
O obstetra que acompanhou Aimée desde o
início da gestação está visivelmente amuado em ter de dar a notícia aos
familiares da jovem, ainda mais visualizando a pequena Lílian tomando seu
primeiro banho e sai da sala de parto desejando estar no lugar de Aimée, pois
mesmo que a morte faça parte da vida e a experiência o ajude a não levar tudo
para o lado pessoal, infelizmente dar a notícia aos que ficaram é sempre a pior
parte que admitir que nem sempre o esforço é recompensado.
O médico encontra Gilberto sentado ao
lado de Fernanda e os cumprimenta. Gilberto se coloca de pé para conversar com
o doutor.
-E aí, doutor? A Lílian já nasceu?
-Sim.
-E como está Aimée? Podemos vê-la?
-Infelizmente, a paciente Aimée
Gallardo Saciotti sofreu pré-eclâmpsia antes do parto e nós nos esforçamos para
que tanto Aimée quanto Lílian sobrevivessem, mas infelizmente Aimée não
suportou dar a luz e faleceu.
-Isso não é verdade, é? – os olhos
incrédulos de Fernanda se recusam a acreditar nas palavras do doutor
-É sempre triste ter de admitir que
perdemos um paciente, mas Aimée não resistiu...
-Claro que resistiu. Aimée é uma
fresca. Cadê ela, hein?
-Infelizmente sua irmã faleceu, menina.
Sinto muito.
-Não sente nada. Você não perdeu
ninguém que amava. Não precisa fingir que está sofrendo porque não está.
Gilberto abraça Fernanda com força e a
garota, chorando, retribui o gesto. Realmente o doutor lamenta o óbito da
paciente, justamente por saber o quanto Aimée desejava ver a criança.
Ao som de Trouble – Coldplay, o
destaque é para Lílian, o centro das atenções na maternidade. O pequeno bebê é
examinado, mas não corre risco de vida.
Gilberto, caminhando pelos corredores,
ainda atordoado com a notícia da morte da filha mais velha, repassa as
discussões com Aimée, o desprezo contra Lílian e desata a chorar sentindo-se o
pior pai do mundo.
Fernanda foi medicada e está em estado
de choque porque não esperava a morte da irmã.
Gilberto acha que o bebê também faleceu
e olhando para o berçário a culpa só aumenta, até que uma enfermeira o tira de
transe.
-Senhor Gilberto, eu acho que tem
alguém que quer conhecê-lo.
Quando Gilberto se vira para fitar a
enfermeira, encontra um lindo bebê enrolado em uma toalha verde.
-De quem é esse bebê? - indaga Gilberto
-É sua neta, senhor.
-Lílian?
-Lílian é mesmo uma guerreira. Não quer
conhecê-la?
-Bem...
-Sua neta é maravilhosa. O senhor é um
avô de muita sorte.
Há muitos anos atrás Aimée nascia após
um parto repleto de complicações. Anos depois Aimée morria dando à luz e Lílian
vinha ao mundo. Gilberto, emocionado, segura o bebê em seu colo e se encanta a
primeira vista.
Som:
Como devia estar – Capital Inicial.
Deus sabe que não fiz propositalmente.
O papel de carta marcava as lágrimas que derramava enquanto escrevia. Menti
muito naqueles versos.
Suprimia o choro e a capacidade de me
apaixonar. Às vezes abraçava o travesseiro e adormecia soluçando, pensando em
minha mãe, no quanto sua ausência transformou toda minha vida. Como eu gostaria
mesmo de que ela estivesse perto de Deus e o pedisse para me mandar um milagre.
Eu necessitava muito de um.
Todo dia eu tinha de conviver com o
desprezo e não estava acostumada a ser só uma qualquerzinha sentada na cadeira.
No colégio, apesar da hegemonia de Ariane, eu tinha meus amigos, meu namorado e
depois que comecei a crer nas palavras de Iury passei a ignorar a mediocridade
dos outros meninos. Aquele problema simplesmente deixou de existir.
Na faculdade eu era apenas a caloura
mal vestida. Ninguém sabia que por detrás daquela moça de rabo-de-cavalo
existia alguém que precisava de carinho e tinha uma história também, talvez não
tão interessante quanto conhecer gente famosa, ter um iate ou virar o ano em
Paris, mas ainda assim tinha algum valor.
Uma vez por semana eu tinha folga lá no
restaurante, então aproveitava para passar o dia estudando na biblioteca da
universidade. Alguém havia esquecido o jornal numa mesa. Resolvi lê-lo para
saber mais sobre as polêmicas envolvendo o então presidente e fuçando os
anúncios encontrei um que veio como uma luz no fim do túnel. Clichê total. O
capítulo especial da novela o qual a mocinha sofredora vive o milagre que a
tira da lama.
Por que não me dar essa chance?
Som: Fields of gold – Sting.
-A Lílian nasceu, mãe... – May avisa a
mãe no salão
-Nasceu?
-Mas a Aimée morreu...
-Credo, Mayra. Quem contou isso?
-Como quem? A Fer, manhê. E os pais do
Iury não querem nem saber da criança...
-Que criança de sorte mais infeliz! O
Gilberto a renega e agora a família do Iury. Pobrezinha.
-Seu Gilberto se apaixonou pela netinha
e disse que vai criá-la, mãe. A Fernanda nunca viu o pai tão abobado na vida.
Triste por causa de Aimée, mas feliz por causa da Lílian...
-Mas a menina nasceu com boa saúde?
-Não só saudável como linda. Fer disse
que ela é toda pequeninha e manhosa. Parece que é a cara do pai...
Iury chega à maternidade e é informado
de que a esposa morreu.
-Tem certeza, mãe?
-Aimée não resistiu ao parto e a
pequena Lílian também não. – avisa Dario
-Lilian também morreu?
-Exatamente, meu filho. Lílian morreu.
– avisa Estela
-Não pode ser. Aimée e Lílian pareciam
tão saudáveis. Não me conformo.
Iury começa a chorar de tristeza por
ter pedido Aimée e Lílian de uma vez só. Em contrapartida, Nilton convence o
primo a procurar Laly.
-Você deveria procurar Laly, Iury.
Agora vocês não tem mais impedimentos.
-Não é o momento.
-Já parou pra pensar que esse momento
pode nunca chegar?
-Me perdoe, Nilton, mas meu mundo ta
destruído demais. Você não deve ter ideia do quanto é difícil perder duas
pessoas que você ama de uma vez só e de forma repentina. Eu acho que nunca vou
superar isso.
-Sugeri que procurasse seu grande amor
justo para melhorar mais rápido, primo. Sabe que eu não gosto de vê-lo triste.
Dario e Estela prezam pelos
estudos do filho e omitem o nascimento da própria neta, dando a guarda desta
para Gilberto.
-Meu pedacinho de Aimée... Minha
querida netinha... Minha florzinha...
Fernanda e Gilberto se
responsabilizarão por Lílian e isso faz com que a morte de Aimée não os derrube
completamente.
-Aimée estava esperando tanto essa
criança. – Fernanda chora
Aimée é enterrada em Chapecó ao lado da
mãe e Lílian é batizada em Guaratuba tendo Fernanda como madrinha.
Gilberto decorou um quarto
especialmente para a netinha e fala dela com um brilho no olhar como se a
tivesse esperado a vida toda. É seu modo de se retratar com Aimée.
-Tudo que vovô puder fazer, farei, neta
querida.
Som:
Dove – Moony.
O letreiro daquele prédio velho e
abandonado era uma proposta tentadora:
`Quer ser
ator/atriz?Essa é sua chance!`
Sempre quis ser atriz. Fiz algumas
peças de teatro no colégio, no entanto, amargava papéis insignificantes.
Ariane, a menina mais linda e popular, era sempre a donzela em apuros. De
repente, minha sorte muda.
Entrei no edifício e precisei subir
mais de 15 andares até chegar ao escritório onde enfim minha tosca e previsível
vidinha ganharia um novo rumo. O lugar não cheirava muito bem, mas desde que
conseguisse realizar meu sonho, nada mais me importava.
A secretária nariguda usava um óculos
fundo de garrafa e ouvia música sertaneja enquanto lixava as unhas e falava ao
telefone. Ao me ver, perguntou:
-Tem hora marcada, moça? Aqui a gente
só atende com hora marcada!
-Eu vim por causa do anúncio.
-Aaah, então você viu o anúncio? Bom,
deixe-me ver se o Cláudio está. Sabe, o Cláudio é um homem muito ocupado...
Cláudio era o dono da agência que
lançava os novos talentos da dramaturgia nas telonas. Na condição em que
estava, seria a atriz mais feliz do mundo se fizesse figuração na novela das 6.
Sentei-me na antessala e aproveitei
para folhear revistas especializadas em celebridades. Nada como ir me
acostumando a minha nova vida. As revistas estavam engorduradas, cheias de
orelhas de burro e com páginas rasgadas.
As notícias eram quase sempre as
mesmas: quem ta pegando quem, quem mudou de emissora, quem terminou com quem,
resumo das novelas, entrevista com personalidades, funeral de outras, quem
sumiu do showbiz. Em breve o Brasil conheceria Laly Antunes Moraes, a pobre
menina que num piscar de olhos seria jornalista e atriz, deixando para trás o
estigma de feia e pobretona.
-Pode entrar. O Cláudio está te
esperando. – avisou a secretária
Que mania de grandeza era aquela? Quem
diabos era eu no fim das contas?
Eu estava contando com ovo em cloaca de
galinha e nem sequer me preparava para um eventual não. Aquela era minha última
esperança de não precisar trancar minha matrícula e eu me agarrava a isso como
uma criança aguarda Papai Noel.
-Lalinha, Lalinha, vamos com calma... –
urrava minha sensatez - Sabe muito bem que esse negócio de book, empresário,
contrato pode não passar de uma arapuca. Sabe que essa gente que lida com tv
pode ser arrogante e não querer nem mesmo trocar uma palavra com você.
-O que você está esperando, gata? Você
é jovem, bonita, atraente, tem um corpo esbelto, ainda mais agora que
emagreceu, não precisa de muita maquiagem e não tem por que temer. Por que não
deixa a timidez e mergulha de cabeça nessa oportunidade, hein? A TV está
precisando de um rosto novo, do seu jeito peculiar de ser e mesmo que demore um
pouco, fazer ponta na novela das 6 já é alguma coisa em vista de ser anônima.
Concorda comigo, vai...
–E se for arapuca? – a sensatez
revidava
-Por que não cala a boca, sua velha
amarga?- meu otimismo era mesmo teimoso
E se eu não fosse bonita e atraente o bastante? E
se demonstrasse estar nervosa? E se ficasse muito evidente que não tinha
nenhuma experiência no ramo?
Cláudio devia ser um daqueles olheiros
esquisitões que te olham de cima em baixo e não te deixam nem mesmo sonhar.
Alto, magrelo, voz afeminada, roupas coladas, daquele tipo que fala esfregando
o dedo na sua cara. O que mais poderia dar errado para mim?
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