quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Confissões de Laly Cap.90 - Na mesma moeda!



Na mesma moeda!


-LALY!

Abel acabava de sair do estabelecimento quando encontrou uma multidão, ainda incrédula, me assistindo. Enquanto não visse aquele carro completamente arrasado, não sossegaria.


Em vista de um coração partido, ferro amassado não era nada. Da mesma maneira com que ele destruiu o que de melhor eu tinha, estava pagando na mesma moeda.

-Laly, para com isso, por favor.

-Vem me fazer parar.

Dentro do salão estava tocando Tarzan Boy – Baltimora. Parecia cena telenovelística. De repente – e não menos que isso – a mocinha ‘surtou’ e resolveu depredar o carro do galã em plena Avenida Beira-Mar.

Os burburinhos do público me motivaram a dar continuidade ao que poderia ser os dois pneus traseiros furados ou um notável arranhão na impecável lataria.

Abel tentava me agarrar pela cintura e era cruelmente repelido. Eu estava completamente indomável. Só mesmo um dardo tranqüilizante saciaria a fúria de uma leoa com o orgulho ferido.


-Dá pra parar de depredar meu carro?

Àquelas alturas eu não queria nem saber de conversar;

-Por que está fazendo isso, Lalinha?Que diabos deu em você?

Meu surto era uma atitude justificável em vista dos seus 6 anos em que fui feita de otária.

Estraguei a vitrificação da carroceria do automóvel do ano. A cada amassado uma pequena dose de prazer. Estilhacei com gosto o pára-brisa. Retorci a placa como se pudesse esmagar sua cabeça.


-Se você não parar, terei de acionar a polícia.


-Faça o que quiser.


-EU VOU CHAMAR A POLÍCIA.


Só assim as meninas perceberam a gravidade da situação e interferiram me agarrando pela cintura. Mayra soltou o pedaço de concreto na calçada.

-Vem, Lalinha. Se acalme.

-NÃO ENQUANTO NÃO DER UMA LIÇÃO BEM DADA NESSE CAFAJESTE.

Mesmo contrariada, entrei no salão acompanhada de minhas amigas. Mayra preparou um copo de água para eu recobrar um pouco da tranqüilidade.

-Lalinha, você é muito doida, guria do céu. Destruiu o carro dele.

Mayra não conseguia conter o riso.

-Eu acho merecido. – Fer confessou

-Claro que foi. – estava rindo a toa ao vê-lo atordoado

-Eu nem devia te contar isso.

-Contar o que, Fer?Pode ir falando...

-Ah, Laly, lembra ontem que você me pediu pra despistá-lo?Pois então... Ele deu em cima de mim...

-CANALHA DESGRAÇADO... AGORA VOCÊ VAI VEEEEER.

Tirei um pé da minha sandália e da porta do salão, atirei na direção dele, que foi atingido na cabeça, mas, como diz um velho e sábio ditado: bicho ruim não morre. Acrescentando: não só sobrevive como é cínico o bastante para crer ter razão.

-Vou ligar pra polícia. Essa situação está fugindo do controle.

A história já havia parado nos ouvidos das outras freguesas de May, atentas a cada cena do extraordinário barraco em plena tarde de segunda-feira.

-Alô?Polícia?


Terrorismo psicológico. Quem sabe acionando 190 eu não me rendesse.


Mayra, surpreendendo Abel pelas costas, confiscou o celular dele.


-Ei, me devolve, por favor.


-Acho que você tem umas continhas pra acertar com a gente.


Abel ficou completamente sem saída.


Som: In your eyes – Kylie Minogue.


-Querem jantar lá em casa?Posso preparar uma lasanha a bolonhesa, especialidade da May. E aí?O que me dizem?

Me lembro até hoje dos bolinhos de chuva da Mayra. Que delícia!

Para Mayra o dia tinha mais que 24 horas. Acordar às 06:15 para preparar o café da manhã, acordar Pepo, fazê-lo tomar banho, levá-lo ao colégio, ir à academia e de lá sair para o salão onde ficava até às 19:00, indo para casa aprontar o jantar, dar jeito na bagunça (apesar de tudo viver sempre nos trinques), passar um tempo de qualidade com Pepo e manter-se sempre linda e presente para Nilton. Mayra estava se saindo uma baita mãezona.


-Não se cansa dessa correria toda? – perguntei

-Me sinto feliz correndo de um lado para outro, sendo útil. Faço o que amo, estou ao lado das pessoas que mais amo e quero bem. Pedir mais alguma coisa seria querer demais. Deus já é tão bondoso comigo.


Depois daquela confusão generalizada, era hora de me desligar dos problemas e curtir a presença de minhas amigas. Oportunidades assim seriam raríssima, levando em conta a distância e os compromissos de cada uma de nós.

-Vai dizer que foi assalto.

Mayra, com as mãos em volta da cintura, ordenava.

-Nem pensar...

-Ou isso ou uma depilação completa por conta da casa.


Que poder de persuasão da minha amiga!

Seria difícil Abel articular um argumento convincente o bastante para mais de 30 mulheres pararem de encará-lo, mas ele, machista, não queria se dar por vencido.

-Vai ter que pagar metade.

Abel era um ótimo chantagista. Eu pagaria na mesma moeda.

-Pois, se é assim, quero meus 6 anos de volta.

-Não seja cínica, Laly.

-Mais cínico é quem me diz. – retruquei

-Por que vocês não dão um tempo e depois conversam?Exaltados é que não resolverão nada. – D. Emília sugeriu


Som: Prazer e luz – Luciana Mello.


Lílian está assistindo sozinha ao programa sensacionalista. Gilberto estranha Fernanda perder seu programa favorito.


-Fernanda ainda não chegou?

-Não, vô. Deve estar proseando no salão.

-Mas a tarde inteira?

-Ela e a May sempre inventam assunto, ainda mais que agora o namorado da Lalinha ta aí.

-Que namorado?

-Um tal de Abel, algo assim... A Laly e a Fer vivem o chamando de traste. O que é traste, vô?

-Traste? – Gilberto é apanhado de surpresa

-Não sabe o que é um traste...

-Bem... O que eu acho é que você é muito nova pra conhecer certos termos.

Som: Pacific coast party – Smash Mouth.


-O que não é entendo é como uma moça instruída e cheia de atitude se envolve com um cafajeste desses...

D. Emília, já a par do assunto, falava como a mãe que não tive.

-O que os olhos não vêem, o coração não sente.

May lavava meu cabelo. Passei do tempo com a tintura.

-O pior é que ela passou 6 anos achando que tinha um príncipe até descobrir que ele era um sapo.

Fernanda poderia muito bem ser apresentadora de um daqueles programadas vespertinos sensacionalistas. Só sua entonação já garantia o sucesso da atração.

-Ainda bem que dei sorte de o Nilton não ser nenhum sex-symbol. Não sei se teria dado certo com o Biel.

-Sua sorte foi ele gostar mesmo de você, não ficar agarrado a lembranças da Naira. – pensei e verbalizei

-Fui mais longe do que a Naira iria.

-Se ficar ruim, o conserto é de graça. – D. Emília brincou

Meu cabelo ficou um espetáculo, muito melhor do que pensei.

Quando quis me desvincular completamente da imagem de Judy Pankekinha, experimentei clarear os cabelos. Abel aprovou. Eu mais ainda.


Som: Soak up the Sun – Sheryl Crow.


Pepo estava vendo TV na sala enquanto nós mulheres, unidas, trabalhávamos como se fôssemos apenas uma. A conversa fazia o tempo voar.

Nilton costumava chegar após às 20:00, tempo suficiente para Mayra deixar o jantar pronto. Nilton exige mesa arrumada.

Fernanda se encarregou de preparar a lasanha enquanto eu recolhia as roupas do varal e May limpava a calçada.


-O dia de hoje não sai tão cedo da minha memória. – Fer disse cuidando do arroz

-Parecia até cena de novela das 7. Não parecia?- Mayra acrescentou com o balde e a vassoura em mãos

-Espero que depois de hoje ele desista de mim.


Finalizei enquanto dobrava as roupas e as colocava em uma cesta de plástico branca.

Ao lado da casa de Mayra havia uma grande árvore onde as crianças gostavam de se aventurar e soltar a imaginação. Ao anoitecer era o esconderijo preferido de ladrões e pervertidos, segundo relatos de vizinhas fofoqueiras.

-Tem alguém olhando pra cá.

-Mas sempre tem. Nilton fica mortinho de ciúmes.

-Todo dia, May? – perguntei

-Esse olhar parece ser conhecido.

-Fernanda e suas crendices.

-To falando sério. Se não acredita, vem ver então, como não estou mentindo.


O filho da mãe estava montado na árvore bisbilhotando a intimidade alheia. Que ridículo!


-MAS ATÉ AQUI?

-O cara não desiste. – Fer queria rir

-SERÁ QUE VOU PRECISAR QUEBRAR A CARA DELE DESSA VEZ?

-Calma, Lalinha. Calma! – May não queria que Pepo ouvisse nossas conversas

-MAS EU VOU DAR UMA LIÇÃO NELE... AH SE VOU...

-Quem muito briga é porque se ama.

Fernanda botava mais lenha enquanto beliscava uma fatia de queijo e vigiava a lasanha no forno.

Saí correndo em disparada, mas não havia me dado conta de que May havia jogado água com sabão na calçada.

AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAI!


CONTINUA...

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