Resistência - 6º Capítulo

6º Capítulo

Marcelo - Eu não sei te explicar. É algo que nem eu mesmo consigo compreender, truta. Eu queria poder ver a Laurinha mais uma vez para ter certeza de que o que eu to sentindo é real.

Karinna abre um sorriso, puxa de leve a manga da jaqueta de Vinicius e o conduz até um canto onde não possam ser vistos por Marcelo, muito menos por Laura.

Karinna - Vinicius, Vinicius... O que a gente faz agora?

Vinicius - E se a Laura não quiser?

Karinna - Quer...

Vinicius - Não imaginei que a Laurinha iria mexer tanto com o Marcelo.

Karinna - Como diria Chapolin Colorado: Suspeitei desde o princípio.

Galpão de Marcelo. Exterior. Noite.

Laura está um pouco receosa em entrar sozinha na festa e faz hora fingindo estar vendo mensagens no celular. É salva pelo fato de ver o carro de Isabel estacionando.

Carro de Isabel. Interior. Noite.

Antes de Adriano e Daiana descerem do carro para curtir a noite, Isabel faz as últimas recomendações a Adriano.

Isabel - Eu vou passar aqui às 22h00min.

Adriano - Por que 22h00min, mãe? É muito cedo.

Isabel - Quem é autoridade por aqui? Eu ou você? Até onde sei, sou sua mãe, portanto você tem de me obedecer, goste ou não. Quer sair, não quer? Sai, mas volta no horário em que eu estipular, Cinderela. 22h00min é o prazo. Vou passar aqui e espero encontra-lo como combinamos.

Adriano está aborrecido.

Adriano - A festa começa pra valer às 22h00min. Não quero ser o nenê da turma.

Daiana - Ele pode dormir lá em casa ou então o Vini o traz.

Isabel - Nem pensar. Ou é 22h00min ou voltamos para casa.

Jonathan (em tom de provocação) - Ele devia ficar em casa.

Adriano (puxa a orelha do irmão, que grita de dor) – A conversa não chegou à creche.

Isabel (repreende Adriano) - OLHA OS MODOS, ADRIANO.

Adriano - É esse pivete aí que não se situa e fica querendo se meter em conversa de adulto.

Isabel (autoritária) - Se continuar com malcriações, não sai mais...

Galpão de Marcelo. Exterior. Noite.

Música San Francisco – Global Deejays. Ferradura sai do galpão para poder fumar e esbarra em Laura. Em outra ocasião e com outra pessoa, a trataria com grosseria, porém tem interesse na jovem e logo muda a expressão facial demonstrando surpresa ao rever Laura.

Ferradura - Você é a moça daquele dia?

Laura - Bom, eu não sei de quem você está falando...

Ferradura - Laura?

Laura - Sim, sou Laura.

Ferradura - Não se lembra de mim, o Ferradura? A gente se conheceu no sábado.

Laura - Ah, é mesmo. Lembrei... Da fila de refrigerantes. Isso?

Ferradura - Tem boa memória, menina. Que bom te encontrar aqui... – cínico – Não sabia que conhecia o Marcelo Ruela...

Laura - Ah, conheço... Minha amiga é amiga dele... Vocês são amigos?

Ferradura - Marcelo é meu truta de longas datas. Não vai entrar?

Ferradura conduz Laura até as dependências da festa. Marcelo vê Laura conversando com Ferradura e pensa que a jovem está ficando com ele, uma vez que Ferradura está de frente para Laura e utilizando-se da gesticulação para chamar a atenção da adolescente. Desapontado, Marcelo apanha a chave do carro no bolso e some da festa.

De dentro do bolso Ferradura tira uma carteira de cigarro, apanha um e oferece a Laura.

Ferradura - Aceita, gata?

Laura - Não, eu não fumo.

Ferradura - Unzinho pelo menos.

Laura - Obrigada, mas não.

Ferradura tira um isqueiro de dentro do bolso da jaqueta de couro, acende o cigarro e dá uma tragada, liberando a fumaça pela boca e suspirando.

Ferradura - Experimenta. É um barato.

Laura tenta despistar Ferradura e está cada vez mais perdida porque o skatista parece predestinado a segui-la.

Ferradura - Se quiser, eu posso trazer uma cervejinha pra você.

Laura - Eu também não bebo.

Ferradura - Um copinho.

A sorte de Laura, se assim é possível descrever, é que Daiana abraça a amiga pelas costas.

Daiana - E aí, fujona? Até pensei que não vinha.

As amigas se abraçam.

Daiana - Pronta pra pegar o Marcelo?

Ferradura - Pegar?

Daiana - ‘Cê’ não ta sabendo?

Laura - Sabendo de que?

Daiana - Laurinha e Marcelo estão namorando.

Ferradura (chocado) - Laura e Marcelo estão namorando?

Daiana - Sim, sim. Namorando.

Surpreso com a notícia, Ferradura não consegue pronunciar nada, apenas dá mais uma tragada no cigarro e solta a fumaça pela boca. Assustada, Laura faz menção de procurar o banheiro apenas para sair de perto de Ferradura. Assim que param em frente à porta do banheiro, Laura questiona a amiga.

Laura - O que você fez, sua doida?

Daiana - Eu só disse a verdade.

Laura - Verdade? Você perdeu a cabeça? Marcelo Ruela namorando comigo?

Daiana - Laura, relaxa...

Laura - Relaxar? – coloca as mãos no rosto em sinal de angústia – Olha a encrenca que você me colocou, Loba. Preciso dar o fora daqui o mais depressa possível.

Daiana - Não sai mesmo.

Laura - Não posso ficar aqui.

Laura tenta seguir até a porta do galpão, mas Daiana impede sua passagem.

Daiana - Laura, não é pra ficar de cara.

Laura - Mas então como é que você quer que eu fique?

Daiana - Vá se divertir...

Laura - Como se houvesse diversão depois do que houve.

Daiana - Um dia você ainda vai me agradecer por esse boato.

Laura - Só o dia em que o mundo virar de cabeça pra baixo. Hoje mesmo eu desfaço esse mal entendido.

Casa de Laura. Sala. Noite.

Amauri e Zélia estão sentados no sofá de três lugares acompanhando ao noticiário como fazem todos os dias. Amauri percebe que Laura não desceu para jantar.

Amauri - Não me diga que Laura passou o dia inteiro dormindo?

Zélia - Saiu com aquela Karinna. Não sei por que, mas não gosto daquela moça.

Amauri - Karinna me parece uma boa pessoa.

Zélia - É uma maluca.

Amauri - Eu acho bom que Laura comece a sair um pouco de casa.

Zélia - Mas não com essa maluca. Nem ela nem aquela tal de Loba. Tenho medo de que fiquem enchendo a cabeça de Laura com asneiras... Entre ver Laura com essas malucas e dormindo, prefiro que ela fique o dia todo na cama...

Amauri - Ficar dormindo não faz bem, ainda mais na idade dela que as meninas querem sair com as amigas, namorar. – suspira – Sinto saudades de quando a casa era mais movimentada, quando as vozes de Elisa e Laura ecoavam pelos recintos e nos contagiavam com essa alegria. Desde que Elisa morreu, o silêncio tomou conta de tudo. Parece que todos morremos.

Zélia - Eu sei, Amauri. Esses últimos 9 meses estão sendo difíceis pra todos nós, mas não é por causa disso que a Laura deve ficar o dia inteiro dormindo trancada naquele quarto. Não sei mais o que fazer com essa menina. A gente mal conversa.

Amauri - Eu acho que Laura devia voltar a fazer terapia.

Zélia - Laura se recusa.

Amauri - Ainda assim, é a melhor solução.

Zélia - Como se Laura entendesse isso...

Amauri - Se pra mim que sou adulto, falar sobre certas coisas é bastante difícil, quando mais pra ela. Eu acho só que Laura não quer continuar abrindo essas feridas. Ela passou por um trauma muito grande. Devíamos conversar com ela.

Zélia - Laura é bastante difícil de convencer. Você sabe.

Amauri - E sei de quem ela herdou isso...

Amauri abraça Zélia que pousa a cabeça nos ombros dele.

Galpão de Marcelo. Interior. Noite.

Música Me chama – Lobão. Laura procura Marcelo para conversar, mas não o encontra. Por estar vestida como uma skatista chama atenção de alguns amigos do rapaz que por sinais a chamam para conversar.

Enquanto isso Daiana e Karinna, sentadas no braço do sofá de Marcelo, proseiam.

Daiana - O tal do Ferradura ficou com o queixo no chão quando soube.

Karinna - Agora é tratar de reunir o casalzinho de uma vez. Mas e quanto a você, Lobinha? E o Adri? O negócio é sério ou é só curtir?

Daiana - Pergunta ao lesado.

Karinna - Ta com medo de tomar a iniciativa?

Daiana - Não sei como chegar nele e falar.

Karinna - Chega de uma vez por todas e abre o jogo. Eu acho que é muito melhor do que continuar nesse chove não molha. Experiência própria. A conversa ainda é o modo mais eficaz de colocar os pingos nos is.

Daiana - Falo com ele?

Karinna - Hoje mesmo, se puder.

Ainda dentro do galpão, mas próximo a rampa em que Marcelo treina, estão Adriano e Vinícius bebendo refrigerante em copinhos de plástico, comendo docinhos e proseando ao som de Linoleum – NOFX.

Adriano - Minha mãe não deve ter entendido que eu já cresci.

Vinicius - Você já conversou com ela?

Adriano - Minha mãe não aceita ser contrariada. Se ela disse, ta dito.

Vinicius - Já que sou o mais velho por aqui, vou te dar um recado pra toda a vida: se você quer ter moral com a sua mãe, obedece. Aí ela vai afrouxar contigo, vai ver que você não é seu irmão e te liberar.

Adriano - 22h00min é muito cedo.

Vinicius - E o que dá da festa sem o dono?

Adriano - Boa pergunta... Cadê o Marcelo?

Daiana e Karinna vão ao encontro dos meninos. Karinna pousa um dos braços no ombro do amado, cochicha algo em seu ouvido e eles deixam Adriano e Daiana a sós.

Adriano - Algum problema, Loba?

Daiana - Eu acho que a gente precisa conversar. – simplifica a agonia - Adri, eu sei que discutir relação é chato, mas eu acho que a gente devia ter essa conversa, até porque nossa ficada já ficou bastante séria.

Adriano - Eu to te levando a sério.

Daiana - Sim, eu sei, mas às vezes não é assim que eu me sinto.

Adriano - Então me diz o que eu tenho que fazer.

Daiana solta às mãos das de Adriano e recua.

Daiana - Por que você nunca me entende?

Adriano - Eu é que nunca te entendo.

Daiana - Você não me entende por que não quer.

Adriano - Eu só não sei aonde você quer chegar.

Daiana - Afinal, a gente ta namorando ou não?