30º
Capítulo
Amauri e Zélia
analisam as imagens que na verdade são daquela festa que Ferradura promoveu
para celebrar a morte da própria mãe.
Ferradura (fingindo comoção) –
Eu é que não gostaria de estar no lugar de nenhum de vocês, senhores pais.
Lamento demais pelo que está acontecendo.
Zélia – Eu nem sei
mais o que dizer, professor. Juro que como mãe não poderia estar mais
frustrada. Tinha tantos sonhos pra minha filha e a vejo jogar a vida fora dessa
maneira, sem um pingo de piedade por mim e pelo Amauri, por nós que lutamos
diariamente pra que não lhe falte nada, desde alimento, teto e estudo...
Ferradura – É isso que eu
sempre digo nas minhas palestras: pai tem que ter pulso firme. Enquanto mora em
casa tem que dar satisfação até de quantas vezes respira. Ta pisando fora da
linha? Castigo, porrada, privação. Não aprendeu? Não aceita as regras da casa?
Rua. O que não dá, senhores pais, é pra fazer vista grossa a isso porque a
droga é um caminho perigoso. Você pensa que tem controle, mas não tem nenhum e
quando vê já até matou pra continuar no vício...
Amauri perde
completamente a compostura e se levanta abruptamente do sofá para tirar
satisfações com Marcelo.
Ferradura – Seu Amauri,
mais calma, por favor.
Amauri ignora
Ferradura e sai de casa. Zélia teme o que possa vir a acontecer e nada
otimista, o rival de Marcelo aproveita para atiçar a mãe de Laura.
Zélia – Amauri, o que
é que você vai fazer?
Ferradura (destrutivo, apoia Amauri) – D.
Zélia, Amauri, como pai, tem que mostrar pulso firme, autoridade, não pode
simplesmente deixar que Laura mande em toda a família...
Amauri sai de
casa e bate a porta principal com tanta violência que por pouco a mesma não vem
ao chão.
Boliche.
Interior. Pista. Noite.
Música
Ride
– The Vines.
Adriano e
Jonathan já foram embora com Isabel e as outras crianças convidadas também,
então quem continua presente são os jovens a fim de cantar, dançar, comer pizza
e beijar na boca.
Laura está
sentada ao lado das amigas abrindo os presentes que recebeu. De Karinna a jovem
ganhou uma cesta com perfumes, sabonetes, aromatizantes e incensos; de Adriano
vários CDs customizados e um caderno de recordações em que todos assinaram; de
Daiana muitas bijuterias e também perfume; de Isabel um suéter colorido feito à
mão pela própria e uma touca também colorida.
Laura – Ah, que
lindo. A D. Isabel é muito prendada, muito caprichosa.
Karinna – Ah, isso ela
é mesmo.
Laura – Que carinho...
(alisa o suéter) Dá até dó de usar... (suspira) A D. Isabel pode até ser um
pouco rigorosa, mas possui uma nata delicadeza pra tricotar, bordar...
Vinicius – Ela também preparou
o bolo e os docinhos.
Karinna – E ficaram
deliciosos...
Marcelo (curioso) –
Vai, Laura, abre os outros presentes...
Laura – Não sei se
vou dar conta de abrir tanta coisa, mas saibam que eu to gostando de tudo,
principalmente de ter sido lembrada que pra mim é o que valeu mais a pena, pra
falar bem a verdade. Essa é a graça do aniversário: celebrar com as pessoas que
você mais ama, aquelas que estão com você durante todo o ano, que te aturam
rindo, chorando, nos dias que nem a gente mesmo se atura...
Laura abre um
dos presentes de Marcelo e dá um gritinho de alegria.
Laura – Um skate?
Marcelo – Você não
tinha me dito que queria aprender?
Laura – Claro que eu
quero aprender.
Karinna – E olha que ‘cê’
vai ter um professor e tanto...
Laura (um pouco insegura) –
Será que eu vou conseguir?
Marcelo – Só não vai
conseguir se não tentar.
Laura – Te aviso de
antemão, Marcelo, que você vai ter que reservar um pouco de paciência porque
serei uma aluna complicada...
Marcelo (carinhoso)
– Terei muita paciência com você...
Não apenas
isso: o skate foi customizado para Laura. Marcelo encomendou o presente de
acordo com o perfil da namorada, para que ela se encoraje e aprenda a andar nem
que seja só para dizer que sabe.
Laura – É sério,
Marcelo. (abraça o amado) Eu to muito, muito feliz. Pra falar a verdade eu to
tão feliz que tenho até medo de falar e já acontecer algo ruim em seguida.
Marcelo – Ta repreendido
em nome de Jesus...
Laura – Na minha vida
sempre foi assim: basta que eu fique feliz por um instante e logo já acontece
alguma coisa pra me arrancar lágrimas.
Marcelo – A partir de
agora não mais.
Laura – Tomara,
porque...
E Laura não
poderia estar mais correta. Amauri praticamente entrou arrombando a porta do
boliche. Se tivesse armas de fogo em casa, teria trazido. Com as próprias mãos
faria justiça, na sua pífia concepção, no cego moralismo que o afasta cada vez
mais da única filha que tem agora.
Possesso de
forma inexplicável, Amauri encontra Laura interagindo com os amigos e puxa a
filha pelos braços a arrastando dali.
Amauri – VAGABUNDA,
DROGADA, INFELIZ...
Laura (extremamente desesperada) - O
QUE FOI AGORA, PAI? O QUE FOI QUE EU FIZ?
Amauri – Claro que
você sabe muito bem o que fez...
Laura – Como entra na
minha festa e me humilha desse jeito diante dos meus amigos?
Amauri – Diante dos
drogados? Vocês deviam é ter vergonha de fechar o boliche pra fazer de boca de
fumo...
Amauri fita
Laura e lhe acerta uma bofetada que deixa os amigos da adolescente com as mãos
atadas.
Daiana – Meu Deus, não
faz isso!
Amauri (destrata Daiana) –
Com a minha filha eu me resolvo muito bem, drogadinha desgraçada...
Vinicius (abraça a irmã e a defende) –
Ô, seu Amauri, não fala assim com a minha irmã não porque ela não merece...
Amauri (completamente fora de si) –
O que vocês mereciam é que a polícia entrasse aqui e acabasse com essa farra.
Laura não sabe
o que dizer, como se portar, não sabe de mais nada.
Laura – Pai, até
agora eu não to entendendo por que você ta agindo desse jeito comigo...
Amauri – Claro que
você sabe, sua cínica.
Laura – Não, eu não
sei.
Amauri – Você já riu
da nossa cara o bastante e não vai mais rir, não vai mais pisar na minha honra.
Nem você nem esse noiado. (olha Marcelo com desprezo)
Ninguém
compreende a fúria de Amauri porque não faz sentido. A festa transcorreu sem
pender para a ilegalidade.
Karinna – Gente, o que é
que deu no Amauri? (arrasada) Tratar a Laura desse jeito...
Amauri conduz
Laura até a porta do estabelecimento, ainda que a garota chore e implore por
redenção, nada comove o marido de Zélia.
Karinna (para os amigos) –
A gente tem que fazer alguma coisa. Não dá pra deixar a Laura ser humilhada
desse jeito...
Marcelo se
sente na obrigação de defender Laura, mas ainda sem fazer uso dos punhos.
Religioso e muito tranquilo, o skatista ainda prefere esclarecer as desavenças
a base da conversa.
Marcelo – Seu Amauri,
larga a Laura, por favor.
Amauri deixa
Laura cair no chão e parte para cima de Marcelo que é acertado por um certeiro
soco no olho direito, caindo na calçada.
Amauri (ameaça Marcelo) – Encosta
um dedo na minha filha mais uma vez e eu acabo com a tua raça, noiado dos
infernos...
Marcelo nem
sequer pode se defender porque enquanto Laura corre para os braços de Daiana e
Karinna, Amauri enche o evangélico de chutes o impedindo de se levantar para
que a briga seja de igual para igual.
Amauri – Minha vontade
era de te matar, seu desgraçado pervertido...
Vinicius tenta
apaziguar o surto de Amauri, mas leva uma cotovelada e cai em cima de um carro
estacionado, rolando e batendo a cabeça no asfalto. Por sorte o irmão de Daiana
consegue se recuperar a tempo de ser atropelado.
As mulheres
ali presentes estão chorando, agoniadas, temendo os próximos instantes enquanto
Amauri espanca Marcelo e de forma que o rapaz não consiga se mover.
Karinna – Meu Deus,
como é que pode tanta violência a troco de nada?
Laura e
Daiana, estarrecidas, não conseguem parar de chorar. Laura chega a soluçar,
tremer, ansiedade semelhante ao dia em que os bandidos a renderam com Elisa e
se mostraram dispostos a qualquer coisa.
Há venturas
que Isabel e os filhos deveriam estar em casa, no entanto Jonathan fez o favor
de esquecer o aparelho móvel na festa e obriga a mãe a retornar ao boliche.
Isabel (dentro do carro) –
Só não esquece a cabeça porque ta grudada, né, senhor Jonathan? Agora se
esquecer de aprontar você não esquece... (reclama) Olha a hora, olha esse
frio... A gente devia estar em casa à uma hora dessas porque com a violência do
jeito que ta não dá pra vacilar...
Isabel percebe
a atípica movimentação em frente ao boliche enquanto manobra o carro para
estacioná-lo e juntamente com os meninos descer para procurar o bendito
aparelho móvel perdido por Jonathan em um canto qualquer.
Isabel – Eu não os
disse que esse lugar a essa hora é um perigo. (dá bronca em Adriano) Depois
você fica brabo quando eu te busco ‘cedo’, mas é por isso, porque eu sei que
depois de certa hora não tem nada pra gente da sua idade na rua... (faz o sinal
da cruz) Que Deus nos livre e guarde em sua santidade e proteção...
Amauri, em
cima de Marcelo, tenta enforca-lo.
Marcelo (implora) –
Por favor, seu Amauri, eu sei que o senhor não é uma má pessoa. Me solta que eu
te explico tudo.
Amauri – Vai explicar
pro diabo, noiado. Eu já sei bem direitinho quem você é...
A princípio
quem olha até pode pensar que o pai de Laura está lutando contra um ladrão, mas
os filhos de Isabel, assustados, gritam chamando a atenção da mãe.
Adriano – Mãe, olha
isso, olha isso...
Isabel – Eu não vou me
intrometer em briga de ninguém, Adriano.
Jonathan – Mas é o
Marcelo, mãe.
Karinna e as
meninas correm pedir a ajuda de Isabel.
Karinna – Dona Isabel,
faz alguma coisa, por favor...
Daiana – Chama a
polícia, conversa com o Amauri, faz qualquer coisa...
Isabel – Mas do que é
que vocês estão falando?
Daiana – Não viu o que
ta acontecendo?
Isabel sabe da
índole de Marcelo, então ao vê-lo sendo reduzido a nada, passa muito mal.
Daiana (para Laura) –
É, Laura, você tinha razão quando disse ter medo de ser feliz...
Adriano ampara
as meninas enquanto Karinna tenta tranquilizar Isabel.
Cada vez mais
pessoas estão se aglomerando para presenciar a briga. Marcelo só é salvo da
morte porque Bituca e Vinícius são obrigados a partir para cima do pai de Laura.
Ferradura
conseguiu o que queria!
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