Resistência - 10º Capítulo

10º Capítulo

Adriano, pela lógica, se pensa, espera e se prepara pro pior, afinal, começou a namorar Daiana e teme que Isabel descubra. É natural pensar que a mãe descobriu o relacionamento e almeja satisfações.

Adriano - Eu posso te explicar.

Isabel - Me enganando desse jeito...

Adriano (chocado) - Não é desse jeito que estão falando por aí não, mãe. Me dá uma chance...

Isabel - Chance?

Adriano - Não é por aí, mãe. Eu posso me explicar.

Isabel - Me dê um bom motivo para acreditar em você.

Adriano - Sou seu filho.

Isabel - Adriano, Adriano... Quem não deve não teme...

Adriano (se ajoelha aos pés da mãe) - Eu ia te contar algum dia...

Isabel - A partir de hoje das 22h00min ninguém passa acordado nessa casa. As aulas voltam amanhã.

Adriano se coloca de pé novamente.

Adriano - As aulas voltam amanhã?

Isabel - E fazem certo. Esses jovens aí sem aula não fazem nada que preste.

Jonathan - As férias duram pouco demais.

Isabel - Já ficaram mais de 3 semanas rateando e ainda reclamam. Quer dizer, vocês reclamam de tudo. Se não tem férias, resmungam. Se tem, acham que é pouco e querem mais. Não entendo vocês jovens. Definitivamente, não entendo...

Isabel volta para a cozinha. Adriano suspira aliviado. Salvo pela volta às aulas.

Casa de Laura. Quarto de Laura. Noite.

Laura está em frente ao espelho experimentando algumas roupas. Por ter crescido bastante no último ano, apesar de não perceber, algumas peças estão pequenas demais. Há um ano mal tinha seios e seu corpo tinha formas mais infantis. Agora aparenta 17, apesar de não ter completado 15.

Laura está de sutiã quando Zélia entra no quarto. Assustada Laura se cobre com um casaco de lã.

Zélia - Não tem nada a esconder aí.

Laura - Não vi que estava aí, mãe.

Zélia - Podemos conversar?

Laura - Podemos...

Laura rapidamente veste a blusa do pijama e se senta na cama ao lado da mãe.

Zélia - Seu pai e eu conversamos muito a respeito e decidimos que você vai voltar a fazer terapia.

Laura - Eu não quero.

Zélia - Mas precisa.

Laura - Eu não preciso de terapia. Tenho amigos.

Zélia - Quais?

Laura - Como quais? – conta nos dedos – Daiana, Karinna, Adri, Vini, Marcelo...

Zélia (com desprezo, gesticula) - Esses não contam.

Laura - Mas são meus amigos. Eu nunca critiquei os seus.

Zélia - Eu não critico, só quero seu bem e não acho saudável você ficar aí nesse quarto dormindo o dia todo.

Laura (se impõe) - Eu não durmo o dia todo.

Zélia - Sempre que passo você está dormindo...

Laura - E quando você passa? Me diz... Quando você vem aqui conversar comigo?

Zélia - Como se com você tivesse diálogo.

Laura - E tem... – suspira - Acontece que você nunca me olha, mãe. Você nunca tem tempo pra mim, pra me ouvir de verdade. É muito fácil decidir minha vida sem perguntar o que eu acho a respeito, afinal, se a vida é minha quem tem de tomar as rédeas sou eu.

Zélia - Mas nem disso você tem condição.

Laura - E eu tenho. Eu não gosto desses remédios, não quero fazer terapia. Eu não preciso disso.

Zélia - Mas seu pai e eu...

Laura - Podem até marcar, pois eu não vou.

Zélia - Deve ser essa gorda maluca que fica te mandando dizer isso. Ela se mete demais na vida dos outros. Não gosto dela.

Laura - Quem tem que gostar sou eu. Eu que sou amiga dela, não você, mas se não for pedir muito, respeita. Ela não te fez nada pra você julgá-la. Deveria agradecer por ela nunca ter se afastado de mim nem desistido da amizade só porque a Elisa morreu. Amigos como ela, a Daiana, o Adri e o Vini estão ficando cada vez mais raros porque as pessoas infelizmente estão agindo como você, se preocupando com a aparência, com o que as pessoas têm e não com o que elas são porque isso é muito mais importante.

Zélia - Nem festa de 15 anos quer fazer.

Laura - E pra que, mãe? Pra fazer social a gente que nem gosta de mim de verdade? O que uma droga de festa vai fazer de diferença na minha vida?

Zélia - Parece que tem mais consideração com essa gorda imunda do que comigo.

Laura - Eu sou apenas um horário àquela psicóloga. Tanto faz se eu vier ou não, se estiver bem ou não. Pra que eu preciso de terapia se tenho amigos?

Zélia - Que seja, mas à aula você vai. Aliás, você volta amanhã.

Laura - Que ótimo... Ficar em casa me tira do sério...

Zélia - O que me tira do sério é você não ser normal.

Laura (ergue a voz) - Mas o que é ser normal?

Zélia - Você sabe que não é.

Laura - E por acaso é errado ser diferente? O que isso te fere?        

Zélia solta ar pela boca e sai do quarto. Laura se levanta para fechar a porta. Música My immortal – Evanescence. Encostando a cabeça na porta, os olhos enchem-se de lágrimas. Sempre soube que Zélia tinha uma preferência maior por Elisa. Não que isso fosse errado na sua concepção, mas sempre se sentiu discriminada pela mãe, uma vez que a relação com o pai sempre foi muito mais frutífera.

Laura se deita de bruços na cama, abraça o travesseiro e chora. Nesses momentos gostaria de não ser assolada pela culpa, de desaparecer, trazer a irmã de volta a vida, o tempo ao que era. Gostaria de não ser quem é por alguns minutos.

Casa de Laura. Quarto de Amauri e Zélia. Noite.

Zélia entra no recinto bufando de ódio e se senta na cama de modo que tão logo Amauri percebe sua presença.

Amauri - Parece que a conversa foi tensa.

Zélia - Não sei mais o que fazer com a Laura.

Amauri - Laura também não é obrigada a fazer terapia se não quiser, meu bem.

Zélia se deita na cama.

Zélia - Elisa faz tanta falta... Com Elisa eu conseguia conversar. Éramos amigas; Elisa me obedecia, fazia tudo que eu queria. Laura não. Laura é teimosa, me enfrenta, faz de tudo pra ser diferente, me irritar.

Amauri - Laura só tem 14 anos, Zélia. Sabe que nessa fase os adolescentes costumam nos contrariar, mas eu ainda acho que tentando negociar com ela é melhor.

Zélia - Então tente você porque eu vou perder a paciência.

Amauri - Pela manhã eu tentarei.

Amanhece...

Música Por que será – Tihuana. 21 de julho. Algumas instituições de ensino estão voltando às aulas logo hoje, como é o caso do colégio em que Adriano, Daiana, Jonathan e Laura estudam. Ainda que o frio esteja insuportável, das responsabilidades ninguém escapa.

Casa de Isabel. Quarto dos meninos. Manhã.

Os meninos dormiram uniformizados para poderem permanecer por mais tempo na cama. Sabendo isso, Isabel os acorda mais cedo ainda abrindo a porta, batendo palmas e puxando os cobertores. Os garotos acordam depressa.

Jonathan - Manhê...

Isabel - Manhê? Manhê?

Adriano finge estar dormindo. Isabel não se convence.

Isabel - Pode ir acordando, Bela Adormecida. – bate palmas – Pode ir abrindo os olhinhos e ir para o banho. – puxa novamente os cobertores de Adriano – Comigo não tem corpo mole. Quer perder a condução?

Adriano se senta na cama ainda esfregando os olhos. Isabel abriu a cortina.

Adriano - Por que eu preciso ir de condução? Nenhum dos meus amigos vai.

Isabel - Você não é seus amigos. Você é você.

Adriano - Não pode confiar em mim, mãe?

Isabel - Não vou deixar que o raio caia duas vezes no mesmo lugar.

E antes que Jonathan saia do quarto para tomar banho, Isabel o adverte.

Isabel - E você, Jonathan. – o menino para exatamente onde está – Você vai ficar de olho no seu irmão...

Jonathan - Babá dele?

Adriano - E eu lá preciso de babá, seu bobo?

Isabel - A palavra ainda é minha. Quando um burro orneia, o outro abaixa a orelha. – para Jonathan – Jonathan, to depositando meu voto de confiança em você. A partir de hoje até o final do ano você vai vigiar o Jonathan e me relatar tudo que ele fizer.  Se ele aprontar qualquer coisinha que seja eu quero saber. Se vacilar, senhor Adriano, sem celular e computador. Estamos entendidos?

Adriano - Sim...

Isabel - Bom mesmo que obedeça.

Casa de Laura. Cozinha. Manhã.

Amauri está tomando café antes de ir trabalhar. Zélia está comendo pão. Laura já pronta para ir à aula chega à cozinha.

Laura - Bom dia.

Zélia - Até pensei que ia precisar te cutucar pra ver se acordava.

Laura (irônica) - Meu despertador funciona muito bem.

Amauri - Planos para depois da aula, Laura?

Laura - Ah, ainda não sei...

Laura passa patê em um pedaço de pão, o molha no café com leite e bebe.

Laura - Por quê?

Amauri - Porque sua mãe quer lhe fazer um convite muito especial.

Laura se senta a mesa e coloca a mochila no chão.

Laura - Especial por quê?

Zélia - Você cresceu bastante nesse último ano e precisa de roupas novas, então eu pensei que pudéssemos sair juntas. O que acha?

Laura (concorda com a cabeça) - Beleza...

Zélia - Posso te buscar depois da aula?

Laura - Pode...

Amauri - Vocês são mãe e filha e precisam conviver mais tempo juntas, agir como amigas, sem segredos, medos...

A ideia de comprar roupas novas à Laura partiu de Amauri.

Escola dos jovens. Exterior. Manhã.

Música Você – Dead Fish. Paula deixa Daiana em frente ao colégio. Daiana acena para a mãe e caminha até o portão que já está aberto. A instituição já está movimentada. Daiana para ao lado direito do portão para esperar Adriano e Laura chegarem.

Condução. Interior. Manhã.

A música da cena anterior continua sendo executada. Bagunça total dentro da van. Crianças correndo, gritando, brincando. Jonathan e Adriano se sentam sempre juntos, por recomendação de Isabel. Jonathan tem preferência pela janela, o que sempre ocasiona em brigas entre os irmãos. É o próprio Jonathan, quando a condução está chegando à rua do colégio, que avisa a Adriano.

Jonathan - To vendo sua namorada...

Adriano - Daiana ta aí?

Jonathan - Ta parada em frente ao portão. Deve estar te esperando pra dar beijinhos. – com os lábios faz barulhos de beijos – Olha, olha, hein, Adriano...

Adriano assobia para chamar a atenção de Neide, a ‘tia da condução’.

Neide - Pois não, Adriano?

Adriano - Tia Neide, pode me deixar na outra quadra?

Jonathan - Não pode não, tia. Não pode não...

Adriano belisca Jonathan.

Adriano - Fica na tua, moleque.

Jonathan enche o irmão de tapas que revida com beliscões e desarrumando o cabelo do caçula. Neide bate palmas a fim de dar fim ao conflito entre os garotos.

Neide - Se não se comportarem, aviso a D. Isabel. – os irmãos fazem silêncio instantaneamente - O combinado é parar em frente ao colégio e é assim que vai ser.

A van para em frente ao portão da escola.

DAIANA VAI DESCOBRIR O GRANDE TEMOR DE ADRIANO?