quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Resistência - 26º Capítulo



26º Capítulo

Marcelo se surpreende com o desfecho da situação. Nunca falou daquele jeito com Laura antes. Ainda assim, é como se estivesse anestesiado das próprias reflexões e estivesse inutilmente descontando em Laura o desprezo dos sogros.

Laura (arrasada) – Você ta gritando comigo?
Marcelo – Olha, Laura, escuta aqui, eu não tenho paciência pra idealização. Eu não sou um principezinho engravatado que vai falar de política e economia com os seus pais. Eu não tenho vocação pra fingir ser o que eu não sou...
Laura – Eu já disse que não sou os meus pais.
Marcelo – Diz que não é, mas bem no fundo me julga como eles.
Laura – Por que ta me tratando mal, Marcelo?
Marcelo – Porque eu preciso falar.
Laura – Uma coisa é falar e outra é gritar e você ta me machucando sem que eu tenha te dado motivos.
Marcelo – Motivos eu tenho de sobra pra não querer te ver.
Laura (atônita) – O que?
Marcelo – Eu vi como seus pais estavam me olhando. Com recriminação, asco, querendo me fuzilar. Eu fiquei feito um idiota tentando fazer de tudo pra impressioná-los e nada deu certo...
Laura – Eu não ligo pro que eles pensam de você... (sacode os ombros, não deixa Marcelo ver as lágrimas dela) Eu amo você, não importa o que eles digam, o que o mundo diga.
Marcelo – Você diz isso agora que quer romper definitivamente com a infância, mas eu sei que logo você vai crescer um pouco mais e não vai querer continuar ao lado do skatista largado que não usa terno e gravata...
Laura – Grande droga! To cagando pro que os outros pensam. Eu não te entendo, Marcelo. Não, eu não to entendendo mais nada... Primeiro você fica lá no teu programinha pregando que a gente tem que ser a gente mesmo, ser fiel a nossa essência, ao que a gente acredita, aí você próprio vem com esse lance de que não pode ficar comigo porque não se acha o bastante pra mim.
Marcelo – Não foi isso que eu disse.
Laura – Não foi, mas chegou muito perto. (decepcionada) Eu me enganei pensando que você tinha maturidade, que podia ser um bom namorado pra mim... De boa, Marcelo, você é uma farsa. (grita e abre a porta do passageiro) Você é uma farsa.
Marcelo - Então já que você pensa assim, acho melhor mesmo a gente dar um tempo.
Laura – Como somente relógio ‘dá tempo’, eu to caindo fora. Eu não gosto de me juntar a hipócritas.

Música If you (lento mix) Magic Box.

Laura desce do carro, bate a porta com força e sai chorando. A dor que a consome é imensa e a faz chorar alto, pensar que talvez não consiga superar o fim de tudo. O inesperado a abraçou novamente.

Dentro do carro Marcelo respira fundo, mas já está completamente arrependido por ter discutido com Laura.

Marcelo – Não posso acreditar que eu fiz isso, Deus. Onde é que eu to com a cabeça?

Marcelo sente vontade de chorar, de deixar o orgulho de lado e procurar Laura, mas não o faz porque a coragem existe, no entanto não se manifesta a ponto de dar-lhe a sabedoria necessária para que console Laura e a faça entender o que ele sentiu.

Marcelo, minutos depois, dá uma volta de carro na esperança de encontrar a amada caminhando por ali e colocar tudo em pratos limpos, agora novamente abusando da razão e não da raiva. Tarde demais.

Casa de Laura. Interior. Tarde.

Zélia abre a porta para Laura que entra chorando em casa e sobe correndo para o quarto. Imediatamente Zélia adivinha o que a garota sente, mas não vai consolá-la; apenas olha para Amauri sentado na poltrona e os dois consentem.

Casa de Laura. Quarto de Laura. Tarde.

Laura está deitada na cama chorando abraçada a um travesseiro.

Casa de Ferradura. Interior. Tarde.

Ferradura escraviza Mayara a fazendo limpar toda a sujeira da festa. Desde latinhas de cerveja amassadas, garrafas quebradas, embalagens de camisinhas e restos de comida.

Ferradura (comendo batata-frita feito um animal) – Limpa direito, vadia.

Quando Margareth era viva, o chão de tacos brilhava porque ela e Mayara costumavam deixar a casa sempre limpa e cheirosa. Mal Ferradura ‘herdou’ o imóvel e o mesmo já recorda um chiqueiro tanto pelo aroma fétido a atrapalhar as narinas quanto pela sujeira e desorganização.

Mayara (passando cera no chão) – Como é que em tão pouco tempo você conseguiu deixar a casa nesse estado? (finaliza) Você é desprezível, Ferradura.
Ferradura (deitado no sofá) – Não tanto quanto você.
Mayara – Depois de tudo que aprontou pra cima do Vinicius, o que foi fazer na casa dele?
Ferradura – Não te interessa.
Mayara – Claro que interessa. (perde a paciência) Até quando vai continuar sendo uma pedra no meu caminho? Até quando?
Ferradura (despreza Mayara) - Continua limpando, sua imprestável. Não vê a sujeira que ta essa casa?
Mayara – Sujeira causada por você, seu animal.
Ferradura – Eu te mandei limpar, não comentar.

Mayara continua resmungando baixinho enquanto passa cera em pasta por todo o ambiente. A campainha soa e a irmã de Ferradura segue limpando, até que a campainha soe novamente e irrite Ferradura.

Ferradura – Você é uma inútil mesmo... Não ta vendo que a campainha ta tocando não?
Mayara (reclama) – Não vê que eu to trabalhando?

A campainha soa mais duas vezes.

Ferradura – Vai atender ou não vai?

Mayara, bufando de raiva, deixa a lata de cera no chão e vai atender a porta. Marcelo veio atrás do amigo para pedir conselhos. Mal sabe ele que está confiando seus segredos a quem quer vê-lo enterrado.

Ferradura – Marcelo?

Casa de Ferradura. Exterior. Tarde.

Ferradura, sentado no primeiro degrau da área e Marcelo está sentado ao lado dele.

Ferradura – ‘Cê’ tem que se ligar que a gatinha é muito novinha, cara. Hoje ela diz que te ama, mas e amanhã? Do amanhã ninguém sabe, truta... (pensa) Terminou mesmo com a gatinha?
Marcelo – Eu não queria ter gritado com ela...
Ferradura – Mas também não vai ficar choramingando por pouca coisa, cara. Cabeça erguida e bola pra frente.
Marcelo – Como se eu conseguisse pensar em outra coisa, mano. Eu amo demais a Laura; por mim até me casava com ela, mas sei que é muito cedo pra isso, que não dá pra agir por impulso e foi justamente o que eu fiz: tava nervoso, de cara com os pais dela e acabei descontando tudo nela.
Ferradura – A coroa não foi com a tua cara?
Marcelo – Não deixou isso declarado, mas deu pra perceber. Qualquer um que estivesse ali notava que nem a Zélia e tampouco o Amauri me queriam ali...
Ferradura – Eles vão fazer a cabeça da gata pra ela se afastar de você, então, Marcelão, saiba que você fez o certo mesmo, espantá-la e partir pra outra porque mulher atrás de você é o que mais tem por aí...

Como a porta da sala está aberta, Mayara que está colocando o tapete na janela, ouve a conversa.

Casa de Laura. Quarto de Laura. Noite.

Laura continua melancólica, ainda chorando muito, sem entender por que Marcelo a destratou, mesmo tendo plena consciência da reação dos pais em relação ao rapaz.

Zélia entra no recinto e sabe que encontraria a filha caçula chorando.

Zélia – Desperdiçando lágrimas por causa de um traste...
Laura – Me deixa, mãe.

Zélia se senta na cama.

Zélia – Não me diga que ele terminou tudo com você.
Laura – Sim...

Zélia é obrigada a disfarçar a satisfação e o faz abraçando a filha.

Zélia – Se ele te merecesse, não a faria chorar.
Laura (confusa, desolada) – Ele nunca gritou comigo antes...
Zélia – Pra você ver só, Laura. (fria, calculista) Pra você ver como a vida faz a gente se surpreender com as pessoas...
Laura – Ele me pediu um tempo...
Zélia (venenosa) – Terminou tudo, mas de forma sutil. Que covarde!

Laura não consegue fazer mais nada além de chorar. Zélia aproveita a fragilidade emocional da filha para persuadi-la a voltar-se contra Marcelo.

Zélia – Eu não senti boas intenções no olhar dele... Alguma coisa nele me deixava incomodada, eu sei lá. (acaricia a cabeça de Laura) Eu sei que não é fácil cair na realidade, mas é o único caminho pra você agora, minha filha. Esquecer tudo que passou e recomeçar, focar mais nos estudos, se afastar dessas más companhias, voltar a frequentar o consultório da Dra. Alana, se inspirar nela... Quando sua mãe lhe falar que alguém não precisa, acredite porque coração de mãe tudo sabe, tudo sente...

Lanchonete. Interior. Noite.

A música San Francisco – Global Deejays é o som de fundo do ambiente nessa casa.

Karinna, Vinicius e Marcelo estão lanchando em uma mesa redonda para 3. Refrigerante e pizza à vontade. Não para Marcelo que tem certeza do grave erro que cometeu com sua amada.

Karinna – Eu devia ter dito a você que a D. Zélia é uma preconceituosa arrogante do nariz empinado que adora julgar tudo e todos.
Marcelo – Eu me senti um lixo lá, cara. Fui todo arrumado, trouxe presente e a Zélia não me sorriu nenhuma vez, muito menos o Amauri que ficou me analisando o tempo todo que até de respirar eu tava com medo. Ainda por cima deram a entender que pra eles skate é coisa de marginal, vagabundo, que não tem valor...
Karinna – Os famosos pré-conceitos da Zélia. Ai ai...
Marcelo – Eu falei que ser skatista é uma coisa e ser bandido é outra, que tem muito skatista de bem, mas tudo que ouvi foram trocadilhos e mais trocadilhos. Era, não menos que isso, uma prova de resistência.
Vinicius – Seu romance com Laura está começando a enfrentar os primeiros obstáculos. Será que você ta mesmo pronto pra encarar tudo e todos pra ficar com a Laura?

2 comentários:

  1. Não acredito que eles deram um tempo por causa dos pais da Laura. E ainda por cima o Marcelo se aconselha com esse endiabrado do Ferradura. Ai,ai..

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  2. Marcelo se aconselha com a pessoa menos recomendada. Ficou nervoso, gritou com a Laura e ainda por cima a Zélia ainda fica feliz com a notícia...

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