26º
Capítulo
Marcelo se
surpreende com o desfecho da situação. Nunca falou daquele jeito com Laura
antes. Ainda assim, é como se estivesse anestesiado das próprias reflexões e
estivesse inutilmente descontando em Laura o desprezo dos sogros.
Laura (arrasada) – Você
ta gritando comigo?
Marcelo – Olha, Laura,
escuta aqui, eu não tenho paciência pra idealização. Eu não sou um
principezinho engravatado que vai falar de política e economia com os seus
pais. Eu não tenho vocação pra fingir ser o que eu não sou...
Laura – Eu já disse
que não sou os meus pais.
Marcelo – Diz que não
é, mas bem no fundo me julga como eles.
Laura – Por que ta me
tratando mal, Marcelo?
Marcelo – Porque eu
preciso falar.
Laura – Uma coisa é
falar e outra é gritar e você ta me machucando sem que eu tenha te dado
motivos.
Marcelo – Motivos eu
tenho de sobra pra não querer te ver.
Laura (atônita) – O que?
Marcelo – Eu vi como
seus pais estavam me olhando. Com recriminação, asco, querendo me fuzilar. Eu
fiquei feito um idiota tentando fazer de tudo pra impressioná-los e nada deu
certo...
Laura – Eu não ligo
pro que eles pensam de você... (sacode os ombros, não deixa Marcelo ver as
lágrimas dela) Eu amo você, não importa o que eles digam, o que o mundo diga.
Marcelo – Você diz isso
agora que quer romper definitivamente com a infância, mas eu sei que logo você
vai crescer um pouco mais e não vai querer continuar ao lado do skatista
largado que não usa terno e gravata...
Laura – Grande droga!
To cagando pro que os outros pensam. Eu não te entendo, Marcelo. Não, eu não to
entendendo mais nada... Primeiro você fica lá no teu programinha pregando que a
gente tem que ser a gente mesmo, ser fiel a nossa essência, ao que a gente
acredita, aí você próprio vem com esse lance de que não pode ficar comigo
porque não se acha o bastante pra mim.
Marcelo – Não foi isso
que eu disse.
Laura – Não foi, mas
chegou muito perto. (decepcionada) Eu me enganei pensando que você tinha
maturidade, que podia ser um bom namorado pra mim... De boa, Marcelo, você é uma
farsa. (grita e abre a porta do passageiro) Você é uma farsa.
Marcelo - Então já que
você pensa assim, acho melhor mesmo a gente dar um tempo.
Laura – Como somente
relógio ‘dá tempo’, eu to caindo fora. Eu não gosto de me juntar a hipócritas.
Música If you (lento mix) Magic Box.
Laura desce do
carro, bate a porta com força e sai chorando. A dor que a consome é imensa e a
faz chorar alto, pensar que talvez não consiga superar o fim de tudo. O
inesperado a abraçou novamente.
Dentro do
carro Marcelo respira fundo, mas já está completamente arrependido por ter
discutido com Laura.
Marcelo – Não posso
acreditar que eu fiz isso, Deus. Onde é que eu to com a cabeça?
Marcelo sente
vontade de chorar, de deixar o orgulho de lado e procurar Laura, mas não o faz
porque a coragem existe, no entanto não se manifesta a ponto de dar-lhe a sabedoria
necessária para que console Laura e a faça entender o que ele sentiu.
Marcelo,
minutos depois, dá uma volta de carro na esperança de encontrar a amada
caminhando por ali e colocar tudo em pratos limpos, agora novamente abusando da
razão e não da raiva. Tarde demais.
Casa de Laura.
Interior. Tarde.
Zélia abre a
porta para Laura que entra chorando em casa e sobe correndo para o quarto.
Imediatamente Zélia adivinha o que a garota sente, mas não vai consolá-la;
apenas olha para Amauri sentado na poltrona e os dois consentem.
Casa de Laura.
Quarto de Laura. Tarde.
Laura está
deitada na cama chorando abraçada a um travesseiro.
Casa de
Ferradura. Interior. Tarde.
Ferradura
escraviza Mayara a fazendo limpar toda a sujeira da festa. Desde latinhas de
cerveja amassadas, garrafas quebradas, embalagens de camisinhas e restos de
comida.
Ferradura (comendo batata-frita feito um animal) –
Limpa direito, vadia.
Quando
Margareth era viva, o chão de tacos brilhava porque ela e Mayara costumavam
deixar a casa sempre limpa e cheirosa. Mal Ferradura ‘herdou’ o imóvel e o
mesmo já recorda um chiqueiro tanto pelo aroma fétido a atrapalhar as narinas
quanto pela sujeira e desorganização.
Mayara (passando cera no chão) –
Como é que em tão pouco tempo você conseguiu deixar a casa nesse estado?
(finaliza) Você é desprezível, Ferradura.
Ferradura (deitado no sofá) –
Não tanto quanto você.
Mayara – Depois de
tudo que aprontou pra cima do Vinicius, o que foi fazer na casa dele?
Ferradura – Não te
interessa.
Mayara – Claro que
interessa. (perde a paciência) Até quando vai continuar sendo uma pedra no meu
caminho? Até quando?
Ferradura (despreza Mayara) -
Continua limpando, sua imprestável. Não vê a sujeira que ta essa casa?
Mayara – Sujeira
causada por você, seu animal.
Ferradura – Eu te mandei
limpar, não comentar.
Mayara
continua resmungando baixinho enquanto passa cera em pasta por todo o ambiente.
A campainha soa e a irmã de Ferradura segue limpando, até que a campainha soe
novamente e irrite Ferradura.
Ferradura – Você é uma inútil
mesmo... Não ta vendo que a campainha ta tocando não?
Mayara (reclama) – Não vê
que eu to trabalhando?
A campainha
soa mais duas vezes.
Ferradura – Vai atender
ou não vai?
Mayara,
bufando de raiva, deixa a lata de cera no chão e vai atender a porta. Marcelo
veio atrás do amigo para pedir conselhos. Mal sabe ele que está confiando seus
segredos a quem quer vê-lo enterrado.
Ferradura – Marcelo?
Casa de
Ferradura. Exterior. Tarde.
Ferradura,
sentado no primeiro degrau da área e Marcelo está sentado ao lado dele.
Ferradura – ‘Cê’ tem que
se ligar que a gatinha é muito novinha, cara. Hoje ela diz que te ama, mas e
amanhã? Do amanhã ninguém sabe, truta... (pensa) Terminou mesmo com a gatinha?
Marcelo – Eu não queria
ter gritado com ela...
Ferradura – Mas também
não vai ficar choramingando por pouca coisa, cara. Cabeça erguida e bola pra
frente.
Marcelo – Como se eu conseguisse
pensar em outra coisa, mano. Eu amo demais a Laura; por mim até me casava com
ela, mas sei que é muito cedo pra isso, que não dá pra agir por impulso e foi
justamente o que eu fiz: tava nervoso, de cara com os pais dela e acabei
descontando tudo nela.
Ferradura – A coroa não
foi com a tua cara?
Marcelo – Não deixou
isso declarado, mas deu pra perceber. Qualquer um que estivesse ali notava que
nem a Zélia e tampouco o Amauri me queriam ali...
Ferradura – Eles vão
fazer a cabeça da gata pra ela se afastar de você, então, Marcelão, saiba que
você fez o certo mesmo, espantá-la e partir pra outra porque mulher atrás de
você é o que mais tem por aí...
Como a porta
da sala está aberta, Mayara que está colocando o tapete na janela, ouve a
conversa.
Casa de Laura.
Quarto de Laura. Noite.
Laura continua
melancólica, ainda chorando muito, sem entender por que Marcelo a destratou,
mesmo tendo plena consciência da reação dos pais em relação ao rapaz.
Zélia entra no
recinto e sabe que encontraria a filha caçula chorando.
Zélia – Desperdiçando
lágrimas por causa de um traste...
Laura – Me deixa,
mãe.
Zélia se senta
na cama.
Zélia – Não me diga
que ele terminou tudo com você.
Laura – Sim...
Zélia é
obrigada a disfarçar a satisfação e o faz abraçando a filha.
Zélia – Se ele te
merecesse, não a faria chorar.
Laura (confusa, desolada) –
Ele nunca gritou comigo antes...
Zélia – Pra você ver
só, Laura. (fria, calculista) Pra você ver como a vida faz a gente se
surpreender com as pessoas...
Laura – Ele me pediu
um tempo...
Zélia (venenosa) –
Terminou tudo, mas de forma sutil. Que covarde!
Laura não
consegue fazer mais nada além de chorar. Zélia aproveita a fragilidade
emocional da filha para persuadi-la a voltar-se contra Marcelo.
Zélia – Eu não senti
boas intenções no olhar dele... Alguma coisa nele me deixava incomodada, eu sei
lá. (acaricia a cabeça de Laura) Eu sei que não é fácil cair na realidade, mas
é o único caminho pra você agora, minha filha. Esquecer tudo que passou e
recomeçar, focar mais nos estudos, se afastar dessas más companhias, voltar a
frequentar o consultório da Dra. Alana, se inspirar nela... Quando sua mãe lhe
falar que alguém não precisa, acredite porque coração de mãe tudo sabe, tudo
sente...
Lanchonete.
Interior. Noite.
A música San
Francisco – Global Deejays é o som de fundo do ambiente nessa casa.
Karinna,
Vinicius e Marcelo estão lanchando em uma mesa redonda para 3. Refrigerante e
pizza à vontade. Não para Marcelo que tem certeza do grave erro que cometeu com
sua amada.
Karinna – Eu devia ter
dito a você que a D. Zélia é uma preconceituosa arrogante do nariz empinado que
adora julgar tudo e todos.
Marcelo – Eu me senti
um lixo lá, cara. Fui todo arrumado, trouxe presente e a Zélia não me sorriu
nenhuma vez, muito menos o Amauri que ficou me analisando o tempo todo que até
de respirar eu tava com medo. Ainda por cima deram a entender que pra eles
skate é coisa de marginal, vagabundo, que não tem valor...
Karinna – Os famosos
pré-conceitos da Zélia. Ai ai...
Marcelo – Eu falei que
ser skatista é uma coisa e ser bandido é outra, que tem muito skatista de bem,
mas tudo que ouvi foram trocadilhos e mais trocadilhos. Era, não menos que
isso, uma prova de resistência.
Vinicius – Seu romance
com Laura está começando a enfrentar os primeiros obstáculos. Será que você ta
mesmo pronto pra encarar tudo e todos pra ficar com a Laura?
Não acredito que eles deram um tempo por causa dos pais da Laura. E ainda por cima o Marcelo se aconselha com esse endiabrado do Ferradura. Ai,ai..
ResponderExcluirMarcelo se aconselha com a pessoa menos recomendada. Ficou nervoso, gritou com a Laura e ainda por cima a Zélia ainda fica feliz com a notícia...
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