CENA 1 - APARTAMENTO DE NOÊMIA
- EXT – NOITE
Continuação imediata da última
cena do capítulo anterior.
MARCELÃO SAIU DO PRÉDIO E FOI
AO ENCONTRO DA POLÍCIA, QUE ACABAVA DE CHEGAR.
MARCELÃO - (dirigindo-se a um dos policiais,
que saltava do carro) Por acaso estão procurando a louca de pedra e bêbada que
atira garrafas pela janela? É ali... (apontou para a janela do apartamento de
Noêmia) eu ia passando, quase levei com uma garrafa na cabeça! Um cidadão não
tem mais segurança em Ipanema!
OS POLICIAS ENTRARAM NO
PRÉDIO. MARCELÃO SE AFASTOU, COM UM AR DE VITÓRIA ESTAMPADO NO ROSTO.
CORTA PARA:
CENA 2 - APARTAMENTO DE
MONTEIRO PRADO - SALA -INT. - NOITE.
NA SALA, O TELEFONE TOCOU E
SENHORINHA ATENDEU. ERA PARA MONTEIRO, QUE ESTAVA ACABANDO DE CHEGAR, JUNTO COM
ISADORA.
SENHORINHA - (disse gravemente) É da Casa de
Saúde...
MONTEIRO PRADO - (estremeceu) Da Casa de
Saúde?! (fez uma pausa e dirigiu-se a Isadora) Meu amor, vá indo para o quarto
e me espere. Vou em seguida...
ISADORA DIRIGIU-SE PARA O
QUARTO. MONTEIRO VOLTOU AO TELEFONE.
MONTEIRO PRADO - Alô? É ele que está falando.
Como? Fugiu? Como é possível?!
A GOVERNANTA ESCUTAVA,
ATENTAMENTE, PROCURANDO ADIVINHAR O QUE A OUTRA PESSOA FALAVA, LONGE DALI.
MONTEIRO PRADO - Me escute: se ela fugiu, não
deve ir longe. Tratem de achá-la! Foi esta tarde? E só agora... Não, aqui ela
não veio! Bem, qualquer notícia, liguem pra cá... ou melhor, não. Isso é
perigoso. Eu me comunico com vocês. Boa noite.
MONTEIRO DESLIGOU. VOLTOU-SE
PARA A GOVERNANTA.
MONTEIRO PRADO - Sim, Senhorinha, era ela.
Fugiu esta tarde. Desapareceu. Ninguém a encontra. E isso acontece na antevéspera
do casamento de Malu!
SENHORINHA - Meu Deus, que horror! E agora, o
que o senhor vai fazer?
O BANQUEIRO OLHOU PARA A PORTA
QUE DAVA PARA OS APOSENTOS E FALOU EM VOZ BAIXA:
MONTEIRO PRADO - Ainda não sei. É preciso que
Malu não perceba nada! Esse idiota não devia ter telefonado para cá! Há sempre
o perigo dela estar escutando na extensão...
ENQUANTO FALAVA, ELE FOI SE
DIRIGINDO PARA O CORREDOR E ENTROU NO SEU QUARTO.
CENA 3 - APARTAMENTO DE
MONTEIRO PRADO - QUARTO DE MONTEIRO - INT. - NOITE.
ISADORA JÁ ESTAVA DEITADA.
MONTEIRO COMEÇOU A DESPIR-SE, QUANDO ELA SENTOU NA CAMA.
ISADORA - Quem é essa mulher que fugiu da Casa
de Saúde?
MONTEIRO PRADO - Ninguém. Quer dizer... uma
pobre coitada que eu ajudo, sempre que posso.
ISADORA FITOU-O, DESCONFIADA, E VOLTOU ADEITAR-SE,
COM OS OLHOS MUITO ABERTOS.
CORTA PARA:
CENA 4 - DELEGACIA - CELA DE
NOÊMIA - INT. - DIA.
NOÊMIA SOMENTE VOLTOU A SI NO
DIA SEGUINTE. CONTINUAVA DEITADA, MAS O AMBIENTE AGORA ERA OUTRO. BEM DIFERENTE
DO SEU APARTAMENTO. DUAS MULHERES MALTRAPILHAS ESTAVAM AO SEU LADO, PORÉM DEITADAS
NO CHÃO. ELA ABRIU OS OLHOS DEVAGAR, TENTOU ERGUER-SE, MAS NÃO CONSEGUIU. A
CABEÇA ESTAVA, COMO SE TIVESSE LEVADO UMA SURRA, OU UMA CACETADA. DEPOIS DE
ALGUMAS TENTATIVAS, PÔS-SE DE PÉ E FOI ATÉ A GRADE. VIU O GUARDA.
NOÊMIA - Não estou entendendo. Que é isso
aqui? (gritou para o policial, postado do lado de fora, no corredor) Ei, você
aí, que é isso aqui?
POLICIAL - (sorriu, irônico) É o Copacabana
Palace, não tá vendo? Espere mais um pouco, que o serviço de quarto já está chegando!
NOÊMIA ARREPIOU-SE.
NOÊMIA - Escute... é uma cadeia?! (e
estupefata, como se estivesse vendo um fantasma) Estou presa?!
POLICIAL - (continuava gozando) Puxa, tu
adivinha as coisas, hem? Adivinhona!...
NOÊMIA - (ainda zonza, procurou concatenar as ideias)
O que aconteceu comigo? Como vim parar aqui?!
UMA DAS MULHERES, DEITADA NO
CHÃO, LEVANTOU A CABEÇA, IRRITADA.
PRESIDIÁRIA - Ô perua, sossega o facho e cala
essa boca!
NOÊMIA - (reagiu com altivez) Quem é a senhora
para me dar ordens? Não me dirija a palavra, pois não sou da sua laia! (olhou
em volta, horrorizada) Que lugar horroroso!
A OUTRA FEZ UM RUÍDO
INSULTUOSO COM A BOCA. O GUARDA TORNOU A RIR. NOÊMIA BATEU COM OS PUNHOS NA
GRADE.
NOÊMIA - Guarda! Abra isso aqui... eu preciso
sair... quero falar com meu advogado!
CORTA PARA:
CENA 5 - APARTAMENTO DE
MARCELÃO - SALA - INT. -DIA.
MARCELÃO RELEU A MANCHETE DA
“FOLHA DO RIO” E DEU OUTRA GOSTOSA GARGALHADA.
MARCELÃO - Vê aí, Cecéu. “Milionária embriagada
depreda apartamento e vai presa”. Não é uma gracinha? Olha só o retrato dela,
entre dois policiais!
CECÉU - (tomou o jornal das mãos do amigo)
Caramba,
Marcelão... Mas esta é a sua
mulher!
MARCELÃO - Minha mulher, não! Mulher do
armador sueco Erick Heden. Eu fui o primeiro da lista.
CECÉU - (continuava espantado, lendo a
notícia) Ela tomou um porre e foi em cana!
MARCELÃO - (completou) Foi em cana e perdeu a
guerra!
LAURINHA ENTROU CORRENDO NA
SALA.
LAURINHA - Bom dia, papaizinho!
MARCELÃO - Estamos salvos, querida! O inimigo
caiu prisioneiro!
MARCELÃO CARREGOU A FILHA NOS
BRAÇOS E COMEÇOU A DANÇAR COM ELA, IMITANDO TOQUES DE CORNETA. TIA LALINHA E
VOSKOPOULUS SURGIRAM NA PORTA, CURIOSOS. MARCELÃO SEGUROU TIA LALINHA PELAS
MÃOS E A OBRIGOU A RODAR COM ELE.
MARCELÃO - Vitória, tia Lalinha! Vitória! O
inimigo vai ser obrigado a depor as armas!
CECÉU - (que só então percebeu o golpe) Saquei!
Genial! Genial, Marcelão!
MARCELÃO - Pois é, velho. O inimigo está
desmoralizado, perdido, arrasado (e gritou para o mordomo) Voskô! Traga o canhão,
vamos comemorar!
VOSKOPOULUS FOI ATÉ O QUARTO E
VOLTOU TRAZENDO A ESPINGARDA, QUE ENTREGOU NAS MÃOS DO PATRÃO. ESTE DIRIGIU-SE
PARA A JANELA E APONTOU PARA FORA. TIA LALINHA TAPOU OS OUVIDOS, APAVORADA.
TIA LALINHA - Meu Deus, que é isso! Você
perdeu o juízo, Celinho?
MARCELÃO - Atenção, pelotão! Fogo! O BARULHO
DOS TIROS MISTURAVA-SE AO SOM DAS BUZINAS DOS CARROS LÁ EMBAIXO, NUM PEQUENO ENGARRAFAMENTO
NA VIEIRA SOUTO.
CORTA PARA:
CENA 6 - DELEGACIA - CELA DE
NOÊMIA - INT. - DIA.
NOÊMIA TIROU UM PÉ DE SAPATO E
BATEU COM ELE NAS GRADES, PARA CHAMAR A ATENÇÃO DO GUARDA, LÁ FORA.
NOÊMIA - Abra aqui! Abra, senão vocês vão se
arrepender! Abra! Eu quero sair!
O GUARDA NÃO SE MOVEU, E ELA
ATIROU O SAPATO NELE.
NOÊMIA - Ficou surdo? Eu exijo que me tirem
daqui ou vão pagar muito caro por essa ofensa! O senhor sabe quem eu sou, por acaso?
POLICIAL - Ô perua barraqueira, fica quieta ou
vai pra cela do castigo, sem direito nem à luz do dia! Tá pensando que isso
aqui é o seu muquifo?
NOÊMIA - (indignada) Perua barraqueira? Meu
muquifo?! Mas o que é isso... Só pode ser uma pegadinha! Ai, meu Deus, devo
estar horrível! É do Faustão? Onde estão as câmeras? Onde? Nunca fui tão
afrontada!
AS PRESAS E O GUARDA CAÍRAM NA
GARGALHADA.
CORTA PARA:
CENA 7 - DELEGACIA - SALA DO
DELEGADO NOGUEIRA -INT. - DIA.
DELEGADO NOGUEIRA - Mas o que é isso?
DETETIVE AMADEU - É a tal da Noêmia Heden,
fazendo o maior escândalo na cela!
SÚBITO, JORGE ALBERTO ENTROU
NA SALA.
JORGE ALBERTO - Bom dia, seu delegado!
Desculpe ir entrando assim, mas é que acabei de ler uma notícia espantosa no jornal:
prenderam minha irmã, Noêmia Heden! (elevou a voz) Sabe, doutor Oliveira, ela é
uma moça muito distinta, mulher de um milionário sueco. Não terá sido um
equívoco, um terrível engano?
O DELEGADO NOGUEIRA E O
DETETIVE AMADEU OLHARAMSE, PARECENDO SE DIVERTIR COMOS TREJEITOS DO COSTUREIRO.
DELEGADO NOGUEIRA - Amadeu, diga ao cabo Jorge
que traga a mulher.
AMADEU SAIU.
DELEGADO NOGUEIRA - Seu Jorge Alberto, como
vai sua fantasia? Pronto pra desfilar no Municipal?
JORGE ALBERTO - Ah, estão muito bem.
Felizmente, consegui terminar a do Sírio Libanês: Sonho de um Beduíno!
DELEGADO NOGUEIRA - O Beduíno é o senhor...
JORGE ALBERTO - Evidente!
NOÊMIA SURGIU NO UMBRAL DA
PORTA. ESTAVA NERVOSA E EXTERIORIZAVA TODA A SUA INDIGNAÇÃO.
NOÊMIA - Nunca fui tão ultrajada, tão
humilhada em toda a minha vida!
JORGE ALBERTO - Mana! (correu para ela e
abraçou-a, delicadamente) Li no jornal, que coisa horrível fizeram com você!
DELEGADO NOGUEIRA - Mas é a senhora? Acho que
já nos conhecemos, não?
NOÊMIA - É claro que nos conhecemos! (deu um
passo à frente, diante da expressão maliciosa do delegado) O que os seus policias
fizeram comigo é revoltante, indesculpável!
JORGE ALBERTO - (revirando os olhos)
Inominável, mana! Inominável!
O DELEGADO CONSULTOU O LIVRO
DE OCORRÊNCIAS.
DELEGADO NOGUEIRA - D. Noêmia, a senhora é
acusada de ter depredado seu apartamento em estado de embriaguez, de ter
ameaçado a vida dos
transeuntes da Rua Montenegro atirando garrafas da janela, de ter atentado
contra a moral dizendo palavrões e de ter infringido a Lei do Silêncio, além de
desacato à autoridade, resistindo à prisão.
ENQUANTO O DELEGADO LIA O
RELATO ESCRITO NO LIVRO, NOÊMIA BALANÇAVA A CABEÇA, DISCORDANDO.
NOÊMIA - Eu não me lembro de ter feito nada
disso. (e lembrando-se de algo) Ei, espere aí, e a pessoa que estava comigo?
DELEGADO NOGUEIRA - A senhora estava sozinha quando
foi presa.
NOÊMIA - Patife! Ele se mandou! Bem, se o
senhor pode me por em liberdade pagando fiança, eu pago!
DELEGADO NOGUEIRA - (sacudiu a cabeça) Não vou
cobrar fiança nenhuma. A senhora pode ir embora. Mas, da próxima vez,
modere-se. Porque não há juiz que vá entregar a guarda de uma criança a uma
alcoólatra!
NOÊMIA ENTENDEU. HAVIA
PERCEBIDO O GOLPE DESFECHADO POR MARCELÃO.
NOÊMIA - (fitou o irmão, aflita) Foi ele,
Jorge Alberto... o Marcelão! Aquele canalha! Estou perdida!
JORGE ALBERTO - (fez um muxoxo) Ai, maninha,
como pôde cair num golpe desses?
CORTA PARA:
CENA 8 - BANCO MONTEIRO PRADO
- SALA DE MONTEIRO- INT. - DIA.
D. VIRGÍNIA - (pelo interfone) Doutor
Monteiro, a sua ligação para a Casa de Saúde Dr. Leivas, na linha 2.
MONTEIRO PRADO - Obrigado, D. Virgínia. (tirou
o fone do gancho) Alô! Aqui é Monteiro Prado. E então, ela já foi localizada? Não?
Nenhuma notícia? (franziu o cenho, preocupado) Entendi... certo. Por favor,
qualquer novidade, qualquer pista dela, me liguem com urgência. Vou ficar
aguardando. Obrigado.
O BANQUEIRO SACUDIU A CABEÇA,
NERVOSO.
MONTEIRO PRADO - Onde se meteu aquela maluca? Caramba,
só me faltava essa agora!
CORTA PARA:
CENA 9 - HOSPITAL - SALA DE
ESPERA - INT. - DIA.
CECÉU ESTAVA SENTADO, LENDO
UMA REVISTA, QUANDO O MÉDICO SURGIU NA SALA.
CECÉU - (levantou-se e foi ao seu encontro) E
então, doutor? Como ela está?
MÉDICO - O estado de D.
Soledad continua muito grave, meu rapaz. Ela está dormindo á base de sedativos.
Só nos resta esperar... Reze, rapaz. Reze bastante.
TATIANA ENTROU NA SALA.
AVISTOU CECÉU E FOI AO SEU ENCONTRO, PISANDO FIRME.
TATIANA - Você não faz mais nada na vida além
de servir de babá pra essa velhota?
CECÉU - Fale baixo, Tatiana, isso aqui é um
hospital!
TATIANA - Cecéu, eu já tou ficando cheia desta
situação! Você não tem mais tempo pra mim! Não me procura mais, tá sempre ao
lado dessa velha caquética!
CECÉU - Pare com isso, Tati! Ela está nas
últimas! Tenha um pouco de compaixão com a coitada!
TATIANA - (fez uma pausa) É mesmo? É tão
grave, assim?
CECÉU - Gravíssimo! Tá no morre, não morre!
CORTA PARA:
CENA 10 - APARTAMENTO DE
GERMANO - SALA - INT. –NOITE
GERMANO ENCHEU AS TAÇAS DE
CHAMPANHA E ENTREGOU-AS A MARCOS E CARMEN, QUE RECUSOU, MUITO SÉRIA.
CARMEN - Obrigada, eu não bebo! Além disso,
não tenho nada para comemorar!
GERMANO - Que é isso, mulher! Amanhã é o dia
do casamento do Marcos! Isso não é motivo pra comemoração?
MARCOS - (fitou a mulher, carinhosamente) Por
favor, D. Carmen... eu queria dizer que sou muito grato a vocês por tudo o que
fizeram por mim. Considero vocês minha família aqui no Rio. Ficarei muito
feliz, não só por esse brinde, mas se puder contar com a bênção de vocês
amanhã, na igreja, e na recepção na casa do Dr. Monteiro...
CARMEN - (referiu-se a Malu) Na casa dela?
GERMANO - Marieta...
MARCOS - (quase súplice) Por mim. Posso...
contar com sua presença e do seu Germano?
VENCIDA, CARMEN PEGOU A TAÇA E
TODOS ERGUERAM AS MÃOS, BRINDANDO.
CARMEN - Vou fazer isso por você, Marcos... Só
por você!
GERMANO - Aos noivos! Que sejam muito
felizes!!
CORTA PARA:
CENA 10 - IGREJA DE SÃO JOSÉ -
INT. - DIA.
NO DIA SEGUINTE, MALU ENTROU
NA IGREJA, BELÍSSIMA, NUM VESTIDO BRANCO EM ORGANZA BRILHANTE, DE BRAÇOS DADOS
COM O PAI, MONTEIRO PRADO, QUE CONDUZIU-A AO ALTAR, ORGULHOSO, ONDE MARCOS A AGUARDAVA.
DEU - LHE O BRAÇO E CONDUZIU-A, EMOCIONADO, À PRESENÇA DE D. IGNÁCIO, QUE
OFICIOU ACERIMÔNIA. ESTAVAM PRESENTES RÚBIA, NOÊMIA, SELMINHA, LUANA, MARCELÃO,
CECÉU, LEANDRO E SENHORINHA, ENTRE DEZENAS DE CONVIDADOS AMIGOS DE MALU E DO
BANQUEIRO. QUANDO TODOS SE RETIRAVAM DA IGREJA, APENAS U
MA MULHER ESTRANHA FOI NOTADA,
SEGUINDO A NOIVA COM UM OLHAR DE TERNURA.
MULHER - (limpou uma lágrima) Meu Deus, como é
linda!...
FIM DO CAPÍTULO 38
0 comentários:
Postar um comentário