CENA 1 - APARTAMENTO DE MONTEIRO PRADO - SALA -INT. - NOITE.
A FESTA NA CASA DO BANQUEIRO MONTEIRO PRADO FOI CONSIDERADA VERDADEIRO SUCESSO PELA CRÔNICA SOCIAL PRESENTE NAS PESSOAS DE HUGO MATIAS E BRUNO ASTUTO. AS FOFOCAS CORRIAM SOLTAS E A ANIMAÇÃO TOTAL. JÁ ERA UM POUCO TARDE QUANDO MARCOS SEGUROU MALU PELA MÃO E LEVOU-A A UM LUGAR MAIS TRANQUILO, À BEIRA DA PISCINA
.
MARCOS - E então... está feliz?
MALU - (sorriu, os olhos brilhando) Muito! Hoje é o dia mais
feliz da minha vida! Sou a mulher mais feliz do mundo. Eu te amo, Marcos.
MARCOS - (falou com sinceridade) Quero te fazer muito feliz, Malu. Muito (olhou o relógio) Escute... você não acha que a gente poderia escapar de fininho? Não esqueça que temos que pegar a estrada, ainda...
MALU - Ótimo, adorei a ideia! Vai ser maravilhoso passar a nossa lua-de-mel no sítio de Teresópolis! Você não aceitou a viagem à Europa como presente de casamento do meu pai... mas isso não importa. O que eu mais quero é tá com você, não importa o lugar. Vou pro quarto me trocar... me espera?
MARCOS - Sempre!
A ALGUNS METROS DALI, LEANDRO, QUE NÃO TIRAVA OS OLHOS DE SELMINHA, CRIOU CORAGEM E APROXIMOU-SE, RECEOSO.
LEANDRO - Oi, Selminha...
SELMINHA - Oi...
LEANDRO - Fiquei a noite inteira te olhando... criando coragem pra falar com você...
SELMINHA - (fingindo desinteresse) Ah, é? Não percebi...
LEANDRO - Escuta, Selminha, eu tou muito arrependido! Você tá certa, eu fui egoísta e burro! Mas olha... eu queria dizer que eu te amo... Tou desempregado... recebo mesada do meu velho... Mas eu quero ter esse filho com você! Se você ainda me quiser...
A EXPRESSÃO DE SELMINHA MODIFICOU-SE. FITOU-O, OS OLHOS BRILHANDO.
SELMINHA - Jura? Você tá falando sério?
LEANDRO - Juro. Eu te amo, Selminha. Fica comigo, vai!
ABRAÇARAM-SE E BEIJARAM-SE, APAIXONADAMENTE.
CORTA PARA:
CENA 2 - APARTAMENTO DE MONTEIRO PRADO - QUARTO DE MALU - INT. - NOITE.
MALU ENTROU EM SEU QUARTO E ACENDEU A LUZ. SENTOU-SE À PENTEADEIRA E COMEÇOU A RETOCAR A PINTURA NO ROSTO. SÚBITO, NOTOU A IMAGEM DE UMA MULHER REFLETIDA NO ESPELHO. VOLTOU-SE ASSUSTADA.
MALU - Quem é a senhora? (súbito, levantou-se) O que está fazendo aqui?
SULAMITA ERA UMA ESQUIZOFRÊNICA. MAS, FORA DOS MOMENTOS DE CRISE, PARECIA UMA PESSOA NORMAL, COMO AGORA. APENAS UM BRILHO ESTRANHO NO OLHAR REVELAVA ALGUMA ANORMALIDADE. TINHA 45 ANOS, MAS APARENTAVA MAIS, OS CABELOS QUASE TOTALMENTE BRANCOS, AMARRADOS ATRÁS NUM COQUE. PARECIA-SE MUITO COM MALU, EMBORA OS ANOS E A DECREPITUDE PRECOCE NÃO JUSTIFICASSEM UMA SEMELHANÇA ACENTUADA.
MALU - (repetiu, recuando amedrontada) Que é que a senhora está fazendo no meu quarto?
SULAMITA - Eu vim vê-la.
MALU - Mas quem é a senhora? Veio para a festa?
MALU ESTAVA REALMENTE INTRIGADA. A MULHER PARECIA CONHECÊ-LA, E À CASA TAMBÉM. TANTO QUE ENTROU SEM SER NOTADA E VEIO TER DIRETAMENTE NO SEU QUARTO. OS OLHOS, SÓ OS OLHOS... MALU SE APAVOROU E CORREU PARA A PORTA.
MALU - (gritou) Senhorinha! Senhorinha!
SULAMITA - (implorou) Não! Não chame ninguém! Não chame, senão eles me levam de volta!
MALU - Eles quem?
SULAMITA - Os enfermeiros!
MALU - Enfermeiros?! (repetiu, mais espantada ainda) A senhora é doente?
SULAMITA - Não! Eu não tenho nada! Mas eles dizem que sou, para me prenderem lá!
SULAMITA OLHOU PARA A FILHA COM IMENSA TERNURA.
SULAMITA - Eu lhe vi na igreja. Como você é bonita. Tem uma pele tão linda!
ERGUEU AS MÃOS PARA ACARICIAR O ROSTO DE MALU, QUE RECUOU, APAVORADA.
MALU - Não chegue perto! Fique longe de mim!
SULAMITA - Fique calma, querida... Por favor, não tenha medo de mim...
MALU - (gritou novamente) Senhorinha! Socorro!
CORTA PARA:
CENA 3 - APARTAMENTO DE MONTEIRO PRADO - PISCINA- EXT. - NOITE.
SELMINHA, LEANDRO, FRED GASPAR E LUANA DANÇAVAM UM ROCK ALUCINADO.
MARCOS - Vocês ouviram um grito?
MONTEIRO PRADO - Foi Malu! (e olhou súbito para Oto, o psicanalista da filha, como que pressentindo o perigo).
EM SEGUIDA, MONTEIRO PRADO LEVANTOU-SE E CORREU PARA O QUARTO DE MALU, SEGUIDO POR MARCOS, OTO E SENHORINHA. GERMANO E CARMEN, QUE ASSISTIRAM A
CENA DO PONTO EM QUE SE ENCONTRAVAM, OLHARAM-SE, INTRIGADOS.
CARMEN - Você viu isso? Ela soltou um grito e todos correram pra ver o que é... Eu sempre falei que essa Malu é perturbada... Coitado do Marcos... nem imagina o que o espera!
GERMANO - (ponderou) Deve ter acontecido alguma coisa... ela não ia gritar assim, a troco de nada...
CORTA PARA:
CENA 4 - APARTAMENTO DE MONTEIRO PRADO - QUARTO DE MALU - INT. - NOITE.
MALU ESTAVA ACUADA CONTRA A PAREDE E, DIANTE DELA, OLHANDO-A COM CARINHO, A MULHER.
MALU - Tirem-na daqui! Ela é louca!
O DOUTOR OTO PEGOU SULAMITA PELO BRAÇO E RETIROUA PARA FORA DO QUARTO.
MARCOS - Quem é essa mulher, Monteiro?
MONTEIRO PRADO - (titubeou) Eu... eu não sei. Não a conheço! Talvez tenha vindo com algum convidado... Não há outra explicação!
APREENSIVA, SENHORINHA ENCAROU O BANQUEIRO.
SENHORINHA - (sussurrou-lhe ao ouvido) Doutor Monteiro, não seria melhor...
MONTEIRO PRADO - (cortou, disfarçando) Isso mesmo, seria melhor todos voltarem para a sala. Podem deixar que o Dr. Oto cuida disso. Vamos, vamos…
CORTA PARA:
CENA 5 - APARTAMENTO DE MONTEIRO PRADO - PISCINA - EXT. - NOITE
NA PISCINA, O CLIMA ERA DE GRANDE FARRA, TIPO “DOLCE VITA”.
CECÉU - (de pileque, abraçou Hugo Matias) Você é meu amigo, cara! Sempre te considerei pra caramba...
HUGO MATIAS - (trôpego) Não, você é que é meu amigo, amigo do peito... Meu grande amigo!
CECÉU - Irmãos! Somos irmãos!
HUGO MATIAS - (ergueu o copo) Então vamos brindar.. a isso! À nossa irmandade!
MARCELÃO DANÇAVA COM LUANA. DE REPENTE, CARREGOU-A NOS OMBROS, ELA RINDO COMO UMA LOUCA, ENQUANTO LEANDRO E SELMINHA SE BEIJAVAM NA BORDA DA PISCINA. SÚBITO, MARCELÃO SAIU CORRENDO, DESEQUILIBROU-SE E CAIU COM LUANA DENTRO D’ÁGUA. MAIS ADIANTE, ISADORA ROÍA-SE DE CIÚMES. ABORRECIDA, ELA AFASTOU-SE PARA O INTERIOR DO APARTAMENTO. IA ENTRANDO, QUANDO DEU COM SULAMITA, SENTADA NO LIVING.
ISADORA - Ei, quem é a senhora?
SULAMITA - (levantou o rosto, serenamente) Eu me chamo Sulamita (apontou para o Dr. Oto) Foi aquele moço que mandou que eu esperasse aqui.
ISADORA - (só então compreendeu) Mas espere... a senhora não é?...
CORTA PARA:
CENA 6 - APARTAMENTO DE MONTEIRO PRADO - LIVING -INT. - NOITE.
SULAMITA CONTINUAVA SENTADA NA POLTRONA, QUANDO ISADORA RETORNOU NA COMPANHIA DE MARCOS E MONTEIRO PRADO.
ISADORA - Monteiro, posso saber o que essa mulher está fazendo aqui?
MARCOS - Quer dizer que a senhora... é... D. Sulamita, a mãe de Malu?
SULAMITA - Sou, sim. Malu é minha filha. O senhor não sabia? Não lhe disseram?
MARCOS - Não.
MONTEIRO BAIXOU A CABEÇA, ARRASADO.
SULAMITA - (dirigiu-se a Marcos) Mas não foi você que se casou com ela? Eu o vi na igreja. Estava muito bonito!
MARCOS - (encarou o sogro, fixamente) Não há como resistir mais, Monteiro. É melhor contar a verdade.
MONTEIRO PRADO - (vencido) Está bem... é verdade. Esta é Sulamita, a mãe de Malu. Ela é esquizofrênica e vive numa Casa de Saúde. Só lhe peço uma coisa, meu genro: não revele a Malu, pelo menos agora. Isso seria um choque para ela, uma desilusão enorme...
EM VOLTA DA PISCINA, A FESTA CONTINUAVA. ESTAVA NO AUGE. TODO MUNDO MEIO ALTO, COM EXCEÇÃO DE CARMEN E GERMANO.
CORTA PARA:
CENA 7 - APARTAMENTO DE MONTEIRO PRADO -ESCRITÓRIO - INT. - NOITE.
O BANQUEIRO ENTROU NO ESCRITÓRIO, PEGOU O TELEFONE E DISCOU, NERVOSAMENTE.
MONTEIRO PRADO - Alô? É da Casa de Saúde? Aqui é Monteiro Prado. Estou ligando para informar que Sulamita foi encontrada. Ela está aqui, na minha casa. Hoje é o casamento da minha filha... ela apareceu de repente e está importunando, constrangendo meus convidados! Por favor, mandem enfermeiros e uma ambulância com urgência. Exijo que tirem essa louca da minha casa imediatamente!
CORTA PARA:
CENA 8 - APARTAMENTO DE MONTEIRO PRADO - PISCINA - EXT. - NOITE.
JORGE ALBERTO APANHOU UMA BEBIDA E CAMINHAVA EM TORNO DA PISCINA, QUANDO FOI EMPURRADO POR MARCELÃO. DEBATEU-SE, COMICAMENTE E FOI SOCORRIDO POR CECÉU, QUE, NA TENTATIVA DE PUXÁ-LO, CAIU DE CABEÇA NA ÁGUA. AJUDADO PELO GARÇOM, JORGE ALBERTO CONSEGUIU SAIR, A PONTO DE TER UM CHILIQUE.
JORGE ALBERTO - Seus... seus mal-educados! Bêbados! Selvagens! Brutos! E agora, o que eu faço?! Meu cabelo! Minha roupa!... Meu sapato italiano! Ai, não acredito que isso tá acontecendo! Ai, eu vou ter um troço!
NAQUELE MOMENTO A ENTRADA DOS DOIS ENFERMEIROS DA CASA DE SAÚDE ATRAIU A ATENÇÃO DO TODOS OS CONVIDADOS, QUE PARARAM PARA ASSISTIR À CENA: OLIVEIRA RAMOS APROXIMOU-SE E, DISCRETAMENTE, MOSTROU A POLTRONA ONDE SULAMITA ESTAVA SENTADA. OS HOMENS DE BRANCO ACERCARAM-SE DELA, SEGURANDO-LHE OS BRAÇOS.
ENFERMEIRO 1 - Vamos, Dona Sulamita. Temos que voltar pra Casa de Saúde.
SULAMITA - Eu quero ficar, moço! Quero ficar com minha filha! Ela mora aqui! Quero ficar com ela! Larga meu braço, moço!
ENFERMEIRO 2 - Vamos, seja boazinha.
SULAMITA - Me larga, moço...
SULAMITA FOI LEVADA POR ELES SOB PROTESTOS.
ENCAMINHARAM-SE PARA A PORTA, ABRINDO PASSAGEM
POR ENTRE OS CONVIDADOS.
CORTA PARA:
CENA 9 - APARTAMENTO DE VALÉRIA - SALA - INT. -NOITE.
ALFREDINHO PREPARAVA UM SANDUÍCHE NA COZINHA, QUANDO JULIO BIRUTA CHEGOU, EM COMPANHIA DE PÉ DE ANJO.
JULIO BIRUTA - Meu camarada, quero que tu conheça o Pé de Anjo. Já te falei dele, tá lembrado?
ALFREDINHO ENCAROU PÉ DE ANJO COM FRIEZA.
ALFREDINHO - Qual é, Julio... por que tu trouxe esse cara aqui, velho?
JULIO BIRUTA - Que é isso, mano! O Pé é um cara de responsa! Tem um esquema maneiríssimo pra gente faturar uma grana mole, mole! Fala aí pra ele, Pé!
PÉ DE ANJO - O negócio é o seguinte, meu irmão...
PÉ DE ANJO COMEÇOU A EXPLICAR O ESQUEMA. ALFREDINHO NEM O DEIXOU CONCLUIR.
ALFREDINHO - É o seguinte, meu velho: cai fora daqui! Tou fora! Tu acha que eu sou otário de entrar numa furada dessas? Pô, Julio, tu tá vacilando, trazendo esse sujeito aqui!
PÉ DE ANJO - (na defensiva) Pega leve, cara!
ALFREDINHO - Pega leve o cacete! Vai, vai, vai! (e empurrou os dois para fora do apartamento).
JULIO BIRUTA - Calma aí, velho, não precisa empurrar…!
ALFREDINHO BATEU A PORTA NA CARA DOS DOIS E VOLTOU PARA O SEU SANDUÍCHE.
CORTA PARA:
CENA 10 - DELEGACIA - SALA DO DELEGADO NOGUEIRA -INT. - DIA.
O RELÓGIO MARCAVA 11H30M QUANDO O DELEGADO COMEÇOU A DESPACHAR. EXAMINAVA O LIVRO DE OCORRÊNCIAS DA NOITE ANTERIOR.
DETETIVE AMADEU - Aconteceu um troço meio chato...
uns garotos puxaram um carro. Uma viatura os perseguiu e
encontrou o carro abandonado numa rua. Eles tinham se mandado.
Mas um deles esqueceu a carteira de estudante.
NOGUEIRA NOTOU QUE AMADEU ESTAVA RETICENTE, TITUBEANDO.
DELEGADO NOGUEIRA - (com certo receio no coração) Estudante?
O DETETIVE TIROU A CARTEIRA DO BOLSO E ESTENDEU-A NA DIREÇÃO DO DELEGADO.
DETETIVE AMADEU - O senhor desculpe. Sei que vai se chatear muito...
DELEGADO NOGUEIRA - (apanhou a carteira, abriu-a e leu) Julio Nogueira... É do meu filho! (controlou-se um pouco, pigarreou) Então, um dos rapazes era ele...
DETETIVE AMADEU - Não se pode afirmar de maneira absoluta. Mas tudo indica que sim.
DELEGADO NOGUEIRA - Como não se pode afirmar? Está na cara que foi ele!
DETETIVE AMADEU - Bem, ele pode ter perdido a carteira, o dono do carro pode ter achado... Ou ele pode ser amigo do proprietário do automóvel, ter andado nele e deixado cair a carteira.
DELEGADO NOGUEIRA - Detetive Amadeu, você não precisa puxar tanto pela imaginação. Está claro que o patife do meu filho está metido nisso. E mais: nessa história, ele não é meu filho! Deve ser tratado como um delinquente qualquer. Ponha todos os seus homens atrás dele. Quero ele aqui, preso. Ou melhor (frisou, com os olhos esbugalhados de ódio) minhas ordens são para capturar os dois malandros (e lembrando-se de alguma coisa) Comece pelo Solar do Catete!
DETETIVE AMADEU - O senhor que manda, doutor!
CORTA PARA:
CENA 11 - APARTAMENTO DO DELEGADO NOGUEIRA -INT. - NOITE.
AO VOLTAR PARA CASA NESSA NOITE, NOGUEIRA SURPREENDEU ODETE FALANDO AO TELEFONE COM JULIO.
ODETE - Filho, quando você volta para casa?
NOGUEIRA - (acercando-se da mulher) É ele? Pergunte onde ele está.
ODETE - Meu filho, onde você está? Ah, no apartamento de Valéria. Selminha já esteve aí, com você? Sei... sei.
NOGUEIRA MEDITOU UM INSTANTE, COMO QUE CONCATENANDO AS IDÉIAS.
NOGUEIRA - Valéria... então foi Alfredinho o parceiro dele no roubo do automóvel (e virando-se para Odete) Eu nem queria lhe dizer. Seu filho está envolvido num roubo de automóvel.
ODETE - (chocada) Não acredito! Eu conheço meu filho! Ele não faria isso!
NOGUEIRA - Você pensa que conhece, como eu também pensava (afivelou o cinturão com o revólver e em seguida, vestiu o paletó) De repente, você vê que ele não é nada do que você imaginava. Nada daquilo que você queria que ele fosse.
ODETE - (notou o cinturão e perguntou, aflita) Você vai sair?
NOGUEIRA - Vou prendê-lo.
FIM DO CAPÍTULO 39
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